Distribuídos em 19 comarcas catarinenses, 32 profissionais tiveram algo mais a comemorar no dia 27 de agosto. Para quem não sabe, foi o Dia do Psicólogo, profissão regulamentada no país nesta data, em 1964. A primeira turma de profissionais concursados do PJSC assumiu em 2009. Antes disso, o Judiciário catarinense contava apenas com a atuação de servidores transpostos de outros órgãos públicos ou em disfunção de cargo. Em 2019, 10 anos após o ingresso dos pioneiros, outros quatro psicólogos chegaram para incrementar o quadro de servidores.
Eles atuam prioritariamente com processos das áreas de família, infância e juventude, criminais e de violência doméstica. Além do trabalho pericial, estão envolvidos nos serviços de mediação, processos de adoção, cursos obrigatórios para pretendentes à adoção, audiências de ações sobre crianças e adolescentes em acolhimento, e articulação com a rede de atenção psicossocial dos municípios, entre outras atividades. Abaixo, histórias de profissionais comprometidos com o ideal de Justiça, entremeadas por suas bagagens pessoais, em experiências aprimoradas em mais de uma década.
Prática potencializou aprendizado
Quando finalizou o curso de Psicologia, Alex Leandro Teixeira Álvaro, hoje com 47 anos, não imaginava que atuaria no Poder Judiciário. Tanto que, logo após a graduação, em 2000, foi em busca de uma carreira acadêmica. Ingressou no mestrado e passou a atuar como docente em instituições de ensino. O interesse pelo trabalho forense veio ao se deparar com um concurso com vagas para psicólogos do TJSC. Alex faz parte da primeira turma de profissionais concursados. “Não era uma área em que tinha conhecimento, ainda era muito restrito. Não havia professores de Psicologia com esta formação, era muito incipiente. Tanto que até acabei lecionando disciplinas sobre o tema”, recorda.
Alex mudou completamente a vida. Da academia para a prática forense, de São Paulo para Santa Catarina. Na comarca de Balneário Camboriú – especificamente na Vara da Família, Infância e Juventude e na Vara da Família, Órfãos e Sucessões -, o psicólogo encontrou lar. “Internamente sempre faço esse agradecimento aos colegas, pois realmente aqui encontrei um lugar muito acolhedor. Tenho respeito, cumplicidade. Vivo um clima ótimo na comarca”, destaca, ao citar que mesmo distante fisicamente dos demais psicólogos do PJ, a troca é frequente, facilitada atualmente pelo auxílio da tecnologia.
Os desafios da carreira de pouco mais de uma década são inúmeros. O principal deles é a alta demanda, seguido da beligerância que existe na esfera judicial, por meio das partes. “O grupo de psicólogos está sobrecarregado como um todo. Não é da instituição, mas de uma demanda crescente da sociedade. A cultura de acesso à justiça é desejável, claro. Então eu vejo que o PJSC tem tentado se adaptar ao incremento de demanda, buscando soluções”, observa.
Alex acredita que, com o passar dos anos, ele e os colegas de turma adquiriram experiência e fundamentos para trabalhar na área. “Quando entramos, a maioria não tinha contato com a esfera do Judiciário para exercer a função de perito auxiliar de juízes. O aprendizado veio junto com a prática, adquirimos base. Foi um desafio conseguir atuar com o máximo de técnica e cuidado”.
Sobre as recompensas da profissão, ele observa que elas aparecem em casos pontuais, principalmente em questões relacionadas à população em vulnerabilidade. “Quando a justiça consegue atender uma demanda compreendendo a vulnerabilidade das pessoas, se despindo de preconceitos e possibilitando recurso para atender a estas necessidades. É este o trabalho que o psicólogo tem que fazer por ética. Nestes casos, poder dar um olhar ético para essas pessoas é a melhor recompensa”, finaliza o psicólogo da comarca de Balneário Camboriú.
O desejo de fazer mais
Desde 2003 no PJSC, a psicóloga Leila Luzia Pires procurou no serviço público um incremento à renda da família. Por sete anos atuou como agente de portaria e comunicação na comarca de Herval d’Oeste. Pela necessidade da equipe, desempenhou diversas funções, como titular ou em substituições a colegas. Porém, o maior desafio foram os anos como contadora judicial, cargo que exigia conhecimentos específicos e dedicação especial. Foi aí que precisou deixar o consultório onde exercia a Psicologia, sem deixar de lado os estudos da área.
“Atuar como psicóloga judiciária era meu maior desejo em termos profissionais. No concurso de 2007, por questões de saúde, eu não pude me preparar. Então, o concurso de 2014 representou a minha oportunidade de realizar esse desejo”, conta a atual psicóloga forense da comarca de Chapecó.
O contato com o meio jurídico preparou a profissional que hoje diz não se surpreender com as demandas atuais. “A atuação da psicologia forense é desafiadora, mas instigante, pela amplitude de assuntos que abarca, pela sensibilidade dos temas tratados e pelo impacto que o trabalho desse profissional pode ter na vida das pessoas. Podemos ser um importante ator na garantia e promoção de direitos e de saúde mental ao mesmo tempo. Isso é motivador”, enaltece.
Apesar da experiência judicial, Leila admite que ainda há muitos desafios. “A demanda é alta e para um trabalho com qualidade precisamos de tempo e estudo, então é difícil conciliar esses dois pontos. Outra questão está no recorte sobre o sujeito, que é diferente para a Psicologia e para o Direito. Então, oferecer objetividade ao fenômeno humano, que é complexo e ambíguo, é um desafio. A atenção ao contexto adversarial e à repercussão dos documentos escritos, para que não se tornem instrumentos de acirramento de conflitos, também é um ponto importante que não se pode perder de vista”.
No entanto, nem toda técnica e conhecimento empregados no exercício da função suprimem a humanidade do profissional envolvido. “As reflexões mais profundas e complexas têm sido no campo da adoção. Das alegrias dos casos bem-sucedidos aos sentimentos e reflexões necessárias quando ocorrem situações mais difíceis, como nas devoluções. A generosidade das (os) colegas para troca de conhecimento e discussão de casos é inspiradora. Sou muito grata às colegas da equipe (psicólogas e assistentes sociais)”, confessa.
Para o futuro, Leila pretende estudar e ampliar o conhecimento, além de acumular experiência para melhorar a atuação e contribuição. E no meio profissional, acredita que ainda há espaço para ampliar a atuação para participar de outras demandas que também visem o bem-estar do próximo.
“A perícia não é a única possibilidade de atuação. O psicólogo no espaço jurídico pode atuar fazendo orientações e acompanhamentos, contribuir para políticas preventivas, estudar os efeitos do jurídico sobre a subjetividade do indivíduo, entre outras atividades que promovam saúde coletiva”, conclui Leila que está à disposição da direção do fórum da comarca, mas atende prioritariamente processos oriundos da Vara da Infância e Juventude.