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Além de carros antigos, garagens que guardam a história da indústria automotiva

Os veículos que marcaram gerações e que hoje conquistam o coração dos colecionadores

Por Vitor Netto Criciúma - SC, 05/09/2021 - 11:34
Fotos: Guilherme Hahn/Toda Sexta
Fotos: Guilherme Hahn/Toda Sexta

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Há registros que mostram que o primeiro carro foi inventado em janeiro de 1886, quando o engenheiro alemão Karl Friedrich Michael Benz registrou a patente DRP 37435. O modelo é bem diferente do que vemos atualmente. Com três pneus do tamanho das rodas de uma bicicleta, chassi feito de madeira, apenas um banco e um volante estilo manivela. A velocidade máxima era de apenas 16 km/h.

Algumas décadas depois, em 1903, Henry Ford fundou sua fábrica automobilística, a Ford Motor Company. Já em 1908, lançou o revolucionário Ford T. Em 1913 instituiu o modelo de linha de produção, que resultou no barateamento e popularização dos automóveis em todo o mundo. 

No modelo Ford T de 1923, o medidor de temperatura fica do lado externo do veículo. (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Já o Fusca, queridinho e um dos carros mais conhecidos no Brasil, começou a ser vendido no país em 1950. No princípio o carro vinha desmontado da Alemanha pela Volkswagen e era montado pela Brasmotor no Brasil. Em janeiro de 1959, foi iniciada a produção do Volkswagen Fusca no Brasil. Entre os anos de 1959 e 1982, o Fusca foi o veículo mais vendido no país. 

E foi por meio de um Fusca 1980 que o empresário Paulo Corbetta iniciou a sua coleção de carros antigos. 

Empresário Paulo Corbetta conta com 50 veículos em sua garagem, 49 carros e uma moto. (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Uma garagem cheia de história e memórias 

Em 2019 o empresário Paulo Corbetta comprou um Fusca 1980. De lá para cá ele já conta com 50 veículos na sua garagem, com 49 carros e uma moto. Os modelos são dos mais variados, desde os quase centenários Ford’s A até Mercedes mais recentes. 

“Eu sempre gostei e tive essa vontade de ter carros. E sempre começa com uma brincadeira. Falei: ‘vou comprar um Fusca, um Landau’. Dai quero comprar uma Kombi, que ainda não comprei e assim vai”, explicou Paulo. “Esses modelos aqui eu praticamente vi todos, eu conheci todos esses carros”, completou. 

Painel de um Ford A 1927 modelo "carretera" que era utilizado em corridas (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Sua garagem também conta com veículos que transmitem a história do mundo. Depois do lançamento do Ford T, veio o Ford A, mais fácil de dirigir. O empresário conta com dois modelos em sua garagem, sendo um do ano de 1929 e um do ano de 1931. Um dos modelos é o conhecido “carreteira” que era utilizado em corridas. O outro modelo é mais sofisticado, contando com o conhecido “banco da sogra” na traseira.

Modelo Ford A de 1923 e o conhecido "banco da sogra" na traseira do veículo (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Outro exemplo é o Gordini Teimoso. “Ele é chamado de Teimoso pois no começo do Governo Militar, o presidente Castello Branco mandou as indústrias produzirem carros mais baratos. Analisando o carro, pode ver que ele não tem um cromado, o teto dele não tem nada é só lata. Então a Willys fez esse modelo Teimoso. Na mesma época da DKW fez o modelo Pracinha, o Simca fez o modelo Jangada e o Fusca Pé de Boi. Era um carro de uma cor bem simples que não tinha nenhum cromado nada”, explicou. 

Modelos brasileiros da década de 1960 são veículos mais baratos, pois contam com poucos acessórios (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Outro veículo raro que ele conta em sua garagem é um Escort XR3 Laser, que sua produção foi de apenas mil unidades. “O Brasil teve as Olimpíadas em 1984 e o país ganhou na categoria Laser, na vela. Em 1985 a Ford fez essa série Laser. É um modelo difícil de achar, o XR3 você acha, mas o modelo Laser é difícil”. 

Hoje a coleção de Paulo conta com veículos como Chevrolet Bel Air 1951, DKW Vemag Vemaguet, Ford 1948, Cadillac 1966, Opala, Santa Matilde, Puma, Dodge Dart RT, Mustang, Maserati, Corvette, Rolls Royce, Puma, Dodge Dart, Mini Cooper 1979, Maverick, entre outros modelos.

Veículos da americana Chevrolet foram sempre foram mais robustos que os carros brasileiros (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Carros estudados e adquiridos com responsabilidade

Os seus veículos foram comprados em leilões, indicações ou em encontros de carros antigos. “Com a pandemia a gente não tem ido aos eventos. Então ultimamente estamos comprando em leilões de carros antigos. Então a gente olha, vai pegando conhecimento. Teve um leilão que fomos para olhar dois carros e o leiloeiro, que já conhecia a gente, falou ‘eu só indico um’”, comentou. 

Um dos responsáveis pelas aquisições de Paulo é o seu advogado Edy Wilson Biava Teixeira. “A gente não se conhecia, então o seu Paulo soube que eu tinha um Maverick e começamos a olhar os carros juntos. No início era para ser somente três carros, hoje estamos com 49”, afirmou Edy. 

Dois modelos Gordinis que Paulo Corbetta conta em sua garagem (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

A maioria dos carros vêm em bom estado, com poucos reparos para serem realizados. O custo investido neles é somente para aprimorá-los. "Tenho um Fusca a álcool que eu gastei nele quase o valor que eu paguei. O que nós mais prezamos é que o carro esteja mais perto do original. Então qualquer Fusca vem com aquelas proteções de para-lamas e outros adereços e falamos ‘vamos tirar tudo e vamos retocar’. E no fim, tive que pintar o carro inteiro pois os tons ficaram diferentes”, contou Paulo.  

Cuidados especiais com as raridades

Atualmente, dois profissionais passam o dia a dia na garagem de Paulo somente para cuidar dos carros: um mecânico, que é o único profissional que cuida dos veículos, e um outro profissional responsável pela limpeza e polimento. 

Modelo FNM ano 1976 na cor amarelo manteiga (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Outra raridade na garagem é um FNM 1976. “Esse carro tem uma história bacana. Nós compramos de uma pessoa de Tubarão e não conseguimos emplacar. Havia a FNM (Fábrica Nacional de Motores) e o caminhão ficou conhecido como o Feneme, utilizado nas minas, então passado um tempo eles fizeram esse carro, o FNM”, afirmou. 

Já um Landau Galaxie 1977 com 32 mil km rodados, no motor de álcool original conta com um interior totalmente em azul. Esse modelo é igual a um que Paulo teve em 1981. “Tem outro Landau que nós já compramos ele bem estragado. Só não esperávamos que tinha que fazer tanta coisa. O Landau tem um problema que ele apodrece essa parte superior traseira. Dai pega na lataria. Então tivemos que refazer isso tudo e tivemos que pintar ele inteiro. E então vão aparecendo outros reparos no motor, na suspensão e outras mudanças que tivemos que arrumar”, contou.  

Os carros são cuidados por dois profissionais especializados no ramo (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

O carro mais potente que Paulo conta em sua garagem é o sonho de consumo de muitos motoristas por aí é um Corvette Stingray 454 Big Block 1972. No veículo também é possível abrir o teto. “É um carro potente com 380 cavalos, motor V8 e com tração na traseira. Ele chega a tremer”, explanou Edy. 

Sonho de consumo de muitos, Corvette Stingray 454 Big Block 1972 (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

O último veículo comprado por Paulo foi um Aero Willys Itamaraty 1968, com um interior todo em couro branco e em detalhes em madeira. “Ele é bem diferenciado. Pois existia o Aero Willys e eles lançaram o Itamaraty para concorrer em Landau. Inclusive na mesma época fizeram o modelo Presidencial, com poucas unidades, que era um pouquinho maior”, contou. “Era dito carro do presidente. O Presidencial era um pouco mais comprido, estilo uma limusine. Mas foram fabricados bem poucos”, completou Edy. 

Aero Willys Itamaraty 1968 comprado em Criciúma (Foto: Guilherme Hahn/Toda Sexta)

Uns dos veículos que Paulo quer adquirir futuramente é uma Kombi. “Outro carro que andamos olhando e quase compramos em um último leilão foi um MG, modelo bem parecido com o MP Laffer”, explica Paulo. 

A história ligada ao automobilismo 

A mesma paixão vivida por Paulo Corbetta é compartilhada por Túlio César de Souza, que além de ser um apaixonado por carros antigos também é grande conhecedor da história por trás desses veículos. “Eu comecei comprando um Chevrolet 48, em 2000, que eu tinha por causa daqueles filmes de Gangster. Mas o meu sonho mesmo sempre foi um Karmann-Ghia. E quando era guri em Laguna uma vez eu conversei com um motorista de carreta e eu perguntei pra ele quanto é que custa esse carro. E ele disse ‘tu vai vender caldo de cana a vida toda e tu nunca vai conseguir comprar um carro desse’ e aquilo ficou no meu subconsciente e eu cresci sempre com o pensamento que um dia eu ia comprar aquele carro”, contou Túlio. 

Prêmios e certificados de participação de Túlio nos eventos (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Após ter comprado o Chevrolet 48 em 2000, em 2009 ele realizou o seu sonho e comprou um Karmann-Ghia vermelho. “O carro tem uma particularidade que é muito bacana, que ele fala sobre a história da família Karmann (alemã) com a junção da família Ghia (italiana). A família Karmann no pós-guerra detinha todos contratos de chassi do mundo. Ela praticamente faliu e não tinha como manter a entrega desses contratos. Então o que ela fez? Ela passou a mão numa parceria com a família Ghia e fizeram uma fábrica no meio dos dois países e fizeram essa junção para que a Ghia pudesse então honrar com os contratos da Karmann e então resolveu fazer um protótipo que unisse essas duas famílias. Então eles combinaram que depois de dez anos da junção das duas famílias eles fizeram um protótipo que une as duas famílias, então surge o Karmann-Ghia”, explicou. 

Após o Karmann-Ghia, Túlio adquiriu um Pavão Chevrolet 1927, um Ford T 1923 e um Fusca Zé do Caixão 1969 quatro portas. “Eu comprei de um juiz que faleceu em Laguna e a família acabou vendendo os veículos. Esse Ford T estava praticamente pronto, só fiz alguns reparos, fiz uma pintura. Além do mais que ele é a história do automobilismo no mundo. Dizem as lendas que na crise do aço de 1920 fez com que o Henry Ford viesse ao Brasil atrás da madeira e ele é um veículo feito com estrutura de madeira”. 

Modelo Ford T 1923 de Túlio (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Atualmente Túlio conta com quatro carros na sua garagem: o Ford T, um Fusca 1973, o Zé do Caixão e agora está finalizando a compra de um DKW 1965. “Esse último que foi o carro que levou a minha esposa para o casamento. Esse que eu estou comprando está em estado de sucata, mas eu estou adquirindo isso pois o sonho da minha filha, de hoje com 23 anos, é de casar com o carro que a mãe dela casou. Então vou adquirir, restaurar e guardar para o casamento dela”.

Modelo Ford T 1923 conta com três portas (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Outro objetivo de Túlio é de futuramente adquirir um Landau LTD 1983. “Era um carro que antigamente as famílias que tinham, tinham um chofer. Eram famílias ricas da época de 70 e 80. Um veículo muito pomposo, com motorização V8”, revelou. Outro veículo que ele busca é o Fusca 1975 que foi do seu pai. “Eu agora estou rastreando esse veículo, mas ainda não consegui encontrá-lo, é um Fusca amarelo manteiga motor 1300L”, completou. 

De casamentos a ações beneficentes 

O quase centenário Ford T 1923 também já viveu momentos glamourosos com Túlio no volante. Ele participa dos eventos beneficentes do Asilo São Vicente de Paulo. “Já foram seis edições. Nós pegamos os idosos e levamos eles de carro a templos religiosos. No último ano que a gente fez, nós levamos 78 idosos para o Caravaggio. Tem muitos que têm Alzheimer e eles relembram momentos que viveram naqueles carros”, contou. 

(Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Além de participar de casamentos, levando a noiva até a igreja e os casados até o baile. No dia da cerimônia, placas decorativas com os nomes dos noivos são fabricadas e colocadas no carro. 

O Ford T tem outras peculiaridades que só quem é colecionador e quem tem o veículo sabe como andar. “Ele é a história do automóvel. O modelo A, que veio depois, tem câmbio, o modelo T não, a motorização dele é no pedal. Então se você quer andar você aperta na embreagem e ele anda, se você soltar ele para. Você aperta no pedal do freio e ele vai para trás, é a ré. E se aperta no pedal do acelerador, é o freio motor. Para você ligar você precisa diminuir a faísca da vela manualmente na alavanca da esquerda e para acelerar você mexe na alavanca da direita. Por isso o apelido de Ford Bigode”, explanou. 

Rodas do Modelo Ford T 1923 é de madeira (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Nunca pergunte o valor a um colecionador

Essa é a dica de Túlio. Conforme ele, essa pergunta vai deixar o colecionador chateado. “Se tu tens interesse e conhecimento pelo carro, faça uma proposta de compra. Chama ele e diz ‘Olha eu gostei muito do teu carro e pelo respeito que eu tenho por este veículo, eu gostaria de adquiri-lo. Você me venderia por tanto?’ Essa é a conversa. Nunca pergunta o preço, pois a gente não estipula. E tu vai chegar em um dia que tu vai me fazer uma proposta que eu posso vendê-lo, mas no outro dia eu me arrependo”, explicou. 

Fusca que Túlio está restaurando (Foto: Vitor Netto/Toda Sexta)

Ele se arrepende de ter vendido o seu Karmann-Ghia e tem o objetivo de recuperar o veículo. “Em uma feira um cara me abordou e perguntou quanto valia. Eu respondi que não estava à venda. Ele argumentou que todo carro está à venda. Eu dei um preço para não vender e ele aceitou a proposta e eu não pude voltar atrás. E hoje eu tenho uma paixão por esse carro que se eu tiver condições, eu vou buscá-lo. Foi um carro que me marcou muito. O Ford T ele é muito mais valoroso, mas eu tenho um apreço muito forte por aquele carro”, afirmou. 

Paixão que não se mede 

Dificilmente você conseguirá pedir para um colecionador escolher o seu carro favorito. Entre os 49 da garagem do empresário Paulo Corbetta, ele não consegue elencar somente um. “Não dá para escolher um preferido. E a mesma coisa para vender, não dá de vender. Para fazer isso eu tenho que desapegar do carro. Até hoje nunca vendi nenhum”, enfatizou. 

Esse apego sentimental é também apresentado por Túlio, que explica que o colecionador vê além de um objeto, um sentimento. “O antigo automobilista não tem só uma vaidade, mas ele tem uma força de expressão que ele vai buscar o que ele não conquistou no passado por falta de condicionamento financeiro, a realização disto no presente. Então é muito mais do que preço, é muito mais do que uma aquisição. É um resgate da própria história. E quando a gente adquire um carro desses a gente compra por um preço, mas a gente passa a estabelecer nele um outro valor. Não é a posse pela matéria, mas a posse pela história simboliza aquela matéria”, finalizou.
 

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