A pneumologista e pesquisadora da Fiocruz, Margareth Dalcolmo, avalia que ainda é muito cedo para a flexibilização das normas de isolamento social no Brasil. A médica esteve em reuniões com o governo e OMS para tratar as estratégias que o país deve adotar no combate ao Covid-19. Nesta sexta-feira, 27, ela concedeu uma entrevista exclusiva para o Programa Adelor Lessa, da Rádio Som Maior. Para a pesquisadora, além da manutenção do isolamento total por mais duas semanas, é hora do grande poder econômico do país auxiliar a população mais necessitada.
Margareth opina que, até o momento, as medidas adotadas pelo país buscaram se assemelhar aos lugares que obtiveram mais sucesso no combate à epidemia do coronavírus. "O Brasil, de maneira correta, tentou chegar perto dos países que nos antecederam. É uma tragédia humanitária muito grande, com um número de mortes que não víamos. Temos tomado as medidas necessárias para tentar minimizar o tamanho da epidemia no Brasil", afirmou.
De acordo com a pesquisadora, o período de pico de crescimento da pandemia no Brasil deve ser na terceira semana de abril, conforme levantado por epidemiologistas. "Ela ainda está crescente, não alcançou o período de estabilidade. As medidas de isolamento social são fundamentais para que consigamos diminuir a transmissão", aponta.
"Sei que o custo social e econômico é grande, mas o Brasil é um país que tem uma força, é a sétima economia do mundo. É a hora da iniciativa privada mostrar a que veio. O Brasil tem uma concentração de renda intolerável e é preciso que essas pessoas, a grande indústria, o grande poder econômico do Brasil, mostrem que podem ajudar aqueles que são despossuídos e nada têm", sugere a médica, lembrando casos no Rio de Janeiro, como a Ambev, que começou a produzir álcool, e a Natura, que produziu sabonete líquido, além de força tarefa para a doação de cestas básicas nas comunidades carentes.
Para Margareth, a flexibilização do isolamento social, neste momento, é um erro. "Deveria durar de maneira bastante séria nas próximas duas semanas. Estamos no início da epidemia. Os epidemiologistas projetam que o pico deve ser na terceria semana de abril, até lá a curva só vai aumentar. Existe uma metodologia científica, estudamos o fluxo, onde há mais transmissão. São modelos matemáticos e epidemiológicos que nos permitem fazer essas projeções", diz.
A especialista desconsidera o uso da cloroquina para o tratamento dos sintomas do Covid-19. O governo federal liberou o uso para os quadros de entubação, quando não há outra alternativa de tratamento. No entanto, o que se viu foram pessoas comprando o medicamento, que tem comprovação na eficácia de doenças como a malária, nas farmácias. Assim, quem realmente precisa não acha o medicamento nas prateleiras. "Quem estocou vai ficar com o remédio apodrecendo em casa", lamenta.
"A cloroquina não tem nenhuma comprovação. Há pequenos relatos de grupos publicados na literatura médica. O estudo que gerou a manifestação infeliz de Trump foi um desserviço. A metodologia não tem robustez para demonstrar que é um tratamento. Há experiências feitas em quadros graves, aqueles em que não há outra alternativa. Apenas nessa circunstância. Qualquer compra de cloroquina em farmácia é uma medida desumana e errada com aqueles pacientes que fazem uso contínuo para as doenças auto-imunes", disse a pesquisadora.
Para Margareth, é difícil fazer um prognóstico de como será a reação do coronavírus no Brasil. O que se sabe, até o momento, é que ele já sofreu mutações no país. "Temos uma situação peculiar. O Brasil tem uma população mais jovem do que a Itália. A epidemia aqui vai comprometer pessoas que não têm tanta idade. Nossos cientistas já decodificaram o vírus e há características de mutação, o vírus 'abrasileirou'. Muita coisa nós não sabemos responder sobre a transmissibilidade no território brasileiro", concluiu.