"Toda criança possui um trauma que precisa ser tratado”. A afirmação é da psicóloga Alice Zanatta, especializada em Psicodrama, ressaltando que a infância é um período importante para a formação da personalidade de cada ser humano". Para ela, alguns traumas são mais leves, outros mais pesados, como por exemplo o caso da criciumense Laura - nome fictício -, que foi abusada sexualmente.
Aos 23 anos, Laura já possui facilidade em falar sobre o assunto e enxerga como uma forma de conscientizar outras pessoas. Para isso, precisou fazer acompanhamento psicológico, além de se abrir com a família. "Chegar até aqui, com essa estabilidade emocional para conseguir tocar nesse assunto não foi nada fácil. O apoio familiar e de profissionais da saúde foram passos muito importantes dentro do processo", destaca.
O abuso sexual aconteceu várias vezes por parte do avó materno, dos nove aos 11 anos de idade. Segundo o Ministério Pública de Santa Catarina (MPSC), com base em dados levantados pelo Programa Sentinela Estadual, uma média de 500 crianças e adolescentes por mês são vítimas deste tipo de violência no estado. "Na grande maioria dos casos, acontece por parte de pessoas que possuem uma ligação direta com a vítima, ou seja, por algum familiar", explicou a psicóloga.
A violência resultou em traumas nos mais diversos campos da versão adulta de Laura. "Isso afetou o âmbito escolar, profissional e relacionamentos em um geral como amizades, amores e afins. Hoje eu ainda carrego algumas marcas, mas de um grau bem menor", explica. Diagnosticada com depressão e ansiedade, a vítima faz uso contínuo dos remédios Zentro, Fluoxetina, Apaxy e tem acompanhamento com terapeuta.
Conforme a psicóloga Alice Zanatta, essas doenças geralmente estão ligadas a traumas vivenciados na infância. Problemas físicos também são frequentes, pois o corpo tende a somatizar. Acontece principalmente com pessoas que não têm a consciência sobre o grande impacto de algumas situações vivenciadas, devido ao bloqueio que o consciente cria para que o cérebro não tenha acesso.
A vulnerabilidade causada pelos traumas
É recorrente que traumas causados na infância sejam resultado de muitos comportamentos durante a vida adulta. Uma criação com o pai ausente pode acarretar em um adulto viciado em drogas e álcool, por exemplo. Trata-se de um mecanismo de defesa para preencher possíveis vazios que existem, ou seja, como se o vicio preenchesse uma necessidade humana que nunca foi satisfeita antes.
Estar dentro de um relacionamento abusivo também é um dos fatores consequentes desses traumas. Ser criado não tendo a devida atenção que merece, sendo extremamente controlado pelos pais e agredido fisicamente e emocionalmente na maior parte do tempo poderá fazer um adulto associar como episódios normais dentro de um vínculo amoroso. "Quando esses traumas não são tratados, a pessoa irá criar alguns bloqueios, deixando muito mais vulnerável dentro de relacionamentos", explicou Alice.
A psicóloga ainda ressalta que se torna mais difícil de identificar quando está vivendo um relacionamento deste gênero e que muitas vezes a vítima pensa que não é digna de ser amada. "Assim como pode impedir que a pessoa entre dentro de um. Ás vezes pode criar bloqueios e ter medo de se relacionar", salientou. Outra situação é essa criança ferida se tornar o próprio abusador e não ter este discernimento.
Segundo Laura, o simples fato de receber um abraço mais apertado de alguém ou um toque em alguma parte do seu corpo já é motivo para criar ressalvas. O sentimento de estranhamento e desconforto sempre se fazem presentes diante de atitudes como essas. No entanto, é algo que ela vem trabalhando dentro de si e que já foi bem pior de lidar.
O melhor caminho para recorrer
Como já apontado pela psicóloga Alice, todo ser humano possui traumas de infância que estão ligados a bloqueios e comportamentos desenvolvidos na fase adulta. A orientação é recorrer a um profissional da saúde, bem como acompanhamento com psicólogo. Nos casos mais graves, o terapeuta poderá direcionar o paciente para um psiquiatra.
Ainda existem muitos paradigmas sobre procurar esses profissionais, associados à famosa frase "é coisa de gente doida". A CCN Brasil, por meio da pesquisa da Organização Pan-Americana de Saúde, ressalta que em todo o mundo há mais de 1 bilhão de pessoas afetadas por transtornos psicológicos.
De acordo com o site oficial, entre as principais doenças está a depressão, com 300 milhões de pacientes; transtorno afetivo bipolar, com 60 milhões de pessoas; demência, em torno de 50 milhões e esquizofrenia que atinge 23 milhões.
"O melhor caminho para superar os traumas é a psicoterapia. O paciente vai se reerguer, se empoderar, quebrar bloqueios e crenças limitantes que foi desenvolvendo ao decorrer da vida. Ter o reconhecimento de que às vezes está um pouco perdido, sem deixar que a pessoa saiba quem ela realmente é", disse Alice.