O importante para o controle das finanças pessoais (empresarial também) é apenas gastar o que cabe no orçamento. Mas o que cabe no orçamento? Que orçamento? O que é, de onde vem, de que se alimenta?
Parece óbvio o que é um orçamento. É um planejamento financeiro onde você define limitações (até onde pode ir) e limites (até onde quer ir tendo como base as limitações). Mas passado essa definição básica, abre-se um mundo de possibilidades.
Existem vários tipos de orçamento e cada um pode ser visto de diversas perspectivas diferentes. Você pode, por exemplo, fazer um planejamento mensal definindo que vai gastar 90% do seu salário líquido e ter esses outros 10% como margem de erro ou reserva. É um jeito de planejar e muito comum, principalmente por seguir a periodicidade mensal e a constância do salário, sempre “chegando” sempre no mesmo dia e o mesmo montante.
Esse mesmo orçamento pode evoluir para “caixinhas” destinadas para despesas especificas, como 30% para a casa, 25% para o mercado, 20% para lazer e assim por diante. Nesse ponto já começa a aparecer, o quanto antes possível, a caixinha da reserva de emergência e, um passo adiante, investimento (mas isso é assunto pra outro texto).
Podemos evoluir para metas de gastos semanais, que aumentam a possibilidade de cumprimento do orçamento do começo ao fim do mês e por aí vai. Ao mesmo tempo, em casos onde o fluxo de caixa acontece em períodos longos, como no caso de agricultores, o orçamento pode ser semestral ou anual. Acho que você já pegou a ideia...
Acontece que esse texto não é (apenas) sobre orçamento, mas sobre crédito. E a ligação entre os pontos é: respeite a linha temporal. É nesse ponto que eu, Marília Fontes (craque de Renda Fixa da Nord Research) e milhares de outras pessoas já encontramos o lado negro no crédito.
Já que é público, vou contar primeiro a história da Marília. Ela conta que, ainda adolescente, ganhou uma conta bancária do pai e recebia uma mesada. Digamos que fosse R$ 500. Em tese, ela teria que gastar, no máximo, esse valor a cada mês, ou uma média de R$ 125 por semana. Era isso... Se perdesse o controle, sobraria mês no fim da mesada.
Acontece que com a conta bancária veio o mágico cartão de crédito, que tem o poder universal de pulverizar as despesas de compras em pequenas parcelas mensais. Aí a lógica é simples: a possibilidade de parcelamento em 10 vezes, por exemplo, amplia o poder de compra de R$ 500 para R$ 5.000. Lógica simples, mas errada. Maldita linha temporal!
O que aconteceu na verdade não foi o aumento do poder de compra, mas sim o seu congelamento. No lugar de poder comprar mais, Marília tornou matematicamente impossível realizar novas compras por 10 meses, já que os R$ 500 que ela recebia já tinham destino definido, que era pagar as parcelas das compras que ela já tinha realizado meses antes.
A história acima pode parecer boba de tão óbvia, e é mesmo. Mas é esse o principio que baseia boa parte da massa de endividados que temos no Brasil. Sem educação financeira, o cidadão aprende essa lição na dor.
Quando o consumidor olha uma televisão nova de R$ 3.000 e pode parcela-la em 12 vezes, ele pensa se pode gastar R$ 250 (visão mensal) e vê que “cabe no orçamento”. Nesse ponto ele falha em olhar o mesmo orçamento anualizado. Ele pode reduzir seu poder de compra para o próximo ano em R$ 3.000. Ele pode ter seu orçamento reduzido em R$ 250 nos próximos 12 meses? Essas são as perguntas que devemos fazer.
Mas, cá entre nós, essas não são as mais animadoras para aquele momento mágico da compra, são?
Não, não são... Mas pense por outro lado...
Como é bom ter sempre a possibilidade de aproveitar uma oportunidade, seja uma viagem, um jantar com amigos, uma oferta de queima de estoque que seja, por ter pensado se realmente precisa daquele mimo hoje...