Nunca li um livro tão rápido pelo puro prazer de acompanhar a história!
Depois que ajustei, na minha cabeça, que livros são como séries e cada capítulo é um episódio, posso dizer que “maratonei” o Na Raça, da Maria Luíza Filgueiras. Esse livro, de 208 páginas, é uma biografia de tripla. É centrado na vida profissional de Guilherme Benchimol, CEO e fundador da XP Inc., mas também conta o nascimento e crescimento da XP Investimentos e a implementação de um modelo de negócio que virou de pernas para o ar o mercado financeiro brasileiro.
A resenha do livro você encontra em qualquer lugar na internet. Não é o que vou apresentar aqui. Vou falar do que me chamou atenção.
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Começando pelo personagem, o estilo do Guilherme me surpreendeu. Ao contrário da pessoa calma, carismática, com fala de fácil compreensão e sem pretensão de ser o dono da verdade. Parece alguém que naturalmente entrou no mercado financeiro, teve uma grande ideia e investiu nela. Mas não! A desconfiança do pai, que é médico e queria o mesmo para o filho, foi boa parte do combustível que impulsionou o foguete XP.
Pelo começo difícil, inclusive psicologicamente, não surpreende, no andamento do livro, que vá se formando um líder com perfil de trator (ele recebe esse adjetivo em algumas passagens do livro), com o foco no objetivo e arrastando a todos e a tudo que fosse necessário para que chegassem ao checkpoint definido (tanto de lucro, tantos clientes, uma aquisição, a entrada de um investidor,...). Vencer com a XP era questão de honra. Representava para Benchimol a validação de que era capaz, de que tinha escolhido o caminho certo, de que tudo que tinha passado teria valido a pena.
Ainda na linha de trator, entram os tombos pessoais necessários para que a empresa chegasse onde chegou, que são, de certa forma, admiráveis. Muitos envolvidos, entre sócios, investidores e colaboradores, ficaram pelo caminho de maneira forçosa. Não há relatos de ninguém que tenha sido passado ou tenha tentado passa-los pra trás. As rupturas eram sempre questão de envolvimento, dedicação, alinhamento de ideias ou desempenho.
É necessário desprendimento para esses “cortes na carne”. Lembra uma regra antiga (mas sempre válida) de que não se deve contratar ninguém que não possa demitir. Não são poucos os exemplos (principalmente em empresas familiares) em que existem as tartarugas nas árvores, que são aquelas pessoas que pouco contribuem, mas seguem na empresa por decisão da diretoria, seja por alguma relação pessoal próxima, seja por serviços prestados. Na XP, para Benchimol, vale o quanto entrega e enquanto entrega.
Falando em entrega, vamos pra resultado e, de resultado, vamos para um jargão/ferramenta/estratégia do mercado de renda variável que é aplicado na corretora: stop loss. A linha de criação de implementação de produtos e práticas era baseada em “stop curto”, ou seja, põe em prática, vê se funciona e, se não funcionar, elimina rápido. Isso não significa agir sem pensar, sem planejar, mas agir quando é necessário, reduzindo perdas. Com essa estratégia, um dos pontos destacados no livro é que a XP nunca teve prejuízo e nunca se alavancou.
Por fim, fica a lição do conservadorismo financeiro do Guilherme e da XP. No começo sofrido, era aperto financeiro, venda de patrimônio particular e criatividade. Nas evoluções, os novos recursos entravam com novos sócios e/ou investidores. Sem empréstimos, sem gastar mais do que tem, sem dar passos maiores que a perna. Essa última vale pra pessoa, pra família, pras empresas e pros Governos (lição difícil!).
Ao contrário do que dizem os influencers, isso é sim uma recomendação de investimento. Recomendo a leitura, principalmente aos empreendedores e possíveis empreendedores, que vão acompanhar as partes boas e ruins da evolução de um negócio que começa do zero.
[o texto acima foi publicado originalmente na edição 016 do Toda Sexta, em 15/01/2021]