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Dia dos Povos Indígenas: nascida na Amazônia, estudante trilha caminho em Criciúma

Seu ingresso a universidade foi pelo Programa Equidade Racial

Por Redação Criciúma, SC, 19/04/2024 - 13:02 Atualizado em 19/04/2024 - 13:22
Foto: Marciano Bortolin/Agecom Unesc
Foto: Marciano Bortolin/Agecom Unesc

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A jornada da acadêmica Lineane Fernandes de Almeida, estudante do curso de Nutrição na Unesc, vai muito além de uma simples narrativa pessoal. É um testemunho vibrante de resiliência, determinação e profundo orgulho de suas raízes indígenas. Nesta sexta-feira (19), dia dedicado à celebração e reconhecimento da diversidade cultural dos povos indígenas, sua história não só inspira, mas contribui para a preservação e valorização de uma riqueza cultural.

Nascida no coração da Amazônia, na última cidade da Transamazônica, Lábrea, Lineane traz consigo as histórias e legados de seus antepassados, marcados por séculos de luta, colonização e resistência. Sua comunidade, os Apurinã, carrega uma história de sobrevivência e resiliência que ressoa em cada etapa de sua jornada.

Foto: Marciano Bortolin/Agecom Unesc

Aos 38 anos, ela busca não apenas conhecimento acadêmico, mas também uma reafirmação de sua identidade cultural. Sua jornada foi marcada por desafios, e por muitas conquistas. Uma delas foi o ingresso por meio do Programa Equidade Racial, lançado há dois anos pela Unesc.

Sua família, composta por indivíduos que enfrentaram caminhos acadêmicos e profissionais desafiadores, é um exemplo vivo do poder transformador da educação e do orgulho de suas origens. Hoje, Lineane, residente há 10 anos na cidade de Criciúma, não apenas frequenta as salas de aula da Unesc, mas é uma voz ativa na defesa dos direitos indígenas e na promoção da valorização de suas culturas.

“Foi um marco para minha família, todos nós ficamos muito felizes quando ingressei na Universidade. Tenho familiares que alcançaram grandes feitos. Tenho primos que são advogados formados em universidades federais, um sobrinho estudando na federal de Curitiba, e primas na Universidade do Estado do Amazonas. Meu sobrinho, por exemplo, obteve uma pontuação alta no Enem, mesmo estudando em escola pública e sem ter acesso a todos os recursos que muitos têm. Ele se esforçou muito, e isso é extremamente importante. É uma vitória para nós, pois de onde venho aprendemos que a educação não é apenas uma opção, mas uma ferramenta para superar obstáculos”, ressalta ela, que é casada e mãe de dois filhos.

Para a reitora Luciane Bisognin Ceretta, a história de Lineane inspira outros indígenas a perseguir seus sonhos e a acreditar no poder da educação como uma ferramenta de transformação social.

“A Unesc é amplamente reconhecida por sua diversidade de grupos de estudos, projetos de Extensão, secretarias dedicadas à diversidade, ligas acadêmicas e por sua postura firmemente anti-racista. Com a implementação deste programa, sentimos que estamos apenas começando a cumprir uma pequena parte do nosso papel, que consideramos histórico, ao oferecer bolsas de 50% e 100% para promover a equidade racial. Reconhecemos plenamente que o acesso à educação não só melhora a qualidade de vida das pessoas, mas também promove sua autonomia e dignidade, afetando positivamente não apenas indivíduos, também suas famílias. Este é o cerne do nosso compromisso”, mencionou a reitora.

Em um relato emocionante, Lineane compartilha a história de sua bisavó, uma sobrevivente das injustiças cometidas durante a era da borracha. Essa história de luta e sofrimento foi transmitida de geração em geração, moldando a percepção da avó sobre sua própria identidade indígena.

“Apesar das adversidades, nunca desistimos de reivindicar nosso espaço e nossa identidade. Meu pai, cacique da aldeia Terra Sagrada, liderou a batalha por um território próprio, um local onde pudessem preservar as tradições e construir um futuro para as próximas gerações”, comenta ela, lembrando ainda da história de sua bisavó, que chegou a ficar com uma corrente presa à sua perna, o chamado grilhão.

“Ela não permitia que ninguém sequer tocasse nela, e, como resultado, ficou gravemente debilitada e doente. Somente quando removeram o grilhão é que sua condição melhorou. Lembro-me claramente da história de minha bisavó, que foi compartilhada na Universidade Federal do Amazonas. É uma narrativa repleta de lutas e sofrimentos. Minha avó, mãe de meu pai, por sua vez, rejeitava sua identidade indígena. Ela nos ensinou que ser indígena era algo negativo, algo para ser esquecido, pois foi assim que ela própria foi ensinada por sua mãe, devido a todas as dificuldades enfrentadas”, recorda.

“A nossa família tem um profundo orgulho das nossas origens. Foi um processo para a minha avó perceber a importância de abraçar a identidade como mulher indígena. Todos na nossa família decidiram registrar-se como indígenas, mas minha avó relutou. Ela tinha receios e temores, preocupada com os desafios que poderíamos enfrentar. Levou um tempo para compreendermos o significado e a relevância desse reconhecimento para nós: sermos valorizados e termos voz na sociedade”, expressa Lineane.

Orgulho

Hoje, Lineane orgulha-se de sua origem indígena e enxerga no dia 19 de abril não apenas uma data de celebração, mas também de reflexão e conscientização. “É um momento para reconhecer a diversidade e a riqueza das culturas indígenas, para honrar aqueles que lutaram e ainda lutam por seus direitos, e para reafirmar o valor e a importância desses povos na construção da identidade brasileira”, lembra.

“Este dia é de extrema importância para mim, pois me permite compartilhar minha história e reforçar a ideia de que temos direitos e valor. A mensagem que desejo transmitir é simples: nós, indígenas, sempre tivemos e sempre teremos valor”, finalizou.

Celebração

Para comemorar e enaltecer a cultura dos povos nativos de Santa Catarina e do Brasil, o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi) promove o 6º Abril Indígena – Aldear a Universidade para a justiça social com a palestra de Maria Agraciada Tupinambá.

A palestrante é educadora, arquiteta, pesquisadora de terra e educação indígena. Integrante do TerraBrasil. Mulher de linhagem Tupinambá e ativista das causas dos povos Pataxó Hã-hã-hãe e Tupinambá do sul da Bahia. Idealizadora e diretora do Instituto Etno. O evento ocorre nesta sexta-feira (19/04), às 19h, no Auditório Edson Rodrigues, na Instituição, e terá como mediador o professor Carlos Renato Carola.

A coordenadora do Neabi, Ondina Lalau de Farias, ressalta a importância deste dia como uma celebração da rica diversidade cultural do povo brasileiro e, especialmente, dos povos indígenas. Ela destaca a necessidade premente de implementar políticas públicas que garantam os direitos dos povos originários e reconhece o papel fundamental que desempenham em nossa sociedade.

Ela enfatiza a importância de preservar essa rica cultura e cultivar uma sensibilidade profunda em relação à comunidade indígena, reconhecendo que a verdadeira essência da vida reside na sustentabilidade. “O exemplo de Fabiano Alves, o primeiro indígena a conquistar o título de mestre na Unesc, demonstra como essas culturas têm muito a nos ensinar, como evidenciado em sua dissertação sobre o modo de vida na aldeia em que vive. A pesquisa dele não apenas enriquece nosso conhecimento, mas nos mostra como podemos aprender e nos beneficiar imensamente com o conhecimento e a sabedoria dessas culturas milenares”, finalizou ela, lembrando também do programa Equidade Racial.

“A conquista de um indígena como mestre na Universidade inspira reflexão e encoraja outros a acreditarem que também podem ocupar esse espaço, o que é de grande importância. A nossa Universidade, por ser comunitária, coloca a diversidade como prioridade, reconhecendo que é por meio dela que enriquecemos nosso aprendizado e promovemos uma comunidade acadêmica mais inclusiva e vibrante”, acrescentou  Normélia.

“Que possamos não apenas preservar essa rica cultura, mas também cultivar uma sensibilidade profunda em relação a essa comunidade, reconhecendo que a verdadeira essência da vida reside na sustentabilidade que os povos indígenas historicamente praticam. Eles não só representam suas tradições, mas nos orientam no verdadeiro exercício da cidadania e na valorização do meio ambiente”, disse Normélia.

Texto: Daniela Savi/Unesc

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