A reportagem da revista e jornal Toda Sexta esteve nos supermercados. Como muitos criciumenses fazem. A região é berço das principais redes do estado, e outras que surgem também ganham espaço em um mercado competitivo. Os segredos, as trajetórias e os perfis dos empreendedores e seus resultados bem sucedidos estão em destaque. Os textos são de Paulo Monteiro com fotos de Guilherme Hahn. Confira!
Criciúma respira e transpira supermercados. É uma das referências da cidade. A clientela constante, as marcas que prosperam, das menores às maiores, o nascimento das grandes redes por aqui e também o avanço de um negócio que só faz crescer. A Avenida Centenário é um verdadeiro cartão postal desse importantíssimo nicho econômico da região. Nela, estão unidades das três principais redes: o Giassi nas proximidades do São Cristóvão, o Angeloni e o Bistek no Centro. Separadas por mínimos quilômetros. É possível ir a pé de uma a outra sem tanto esforço. Isso ajuda a fazer de Criciúma um berço dos supermercados em Santa Catarina.
Criciúma, Içara e Nova Veneza são algumas das cidades do sul cujas histórias são marcadas pelo nascimento de algumas das maiores redes. Criciúma foi o lugar onde surgiu o Manentti, em 1942, e o Angeloni, em 1958. Em Içara, logo em 1960, nascia a primeira loja da rede Giassi. Anos mais tarde, desta vez em Nova Veneza, em 1980, era a vez do pontapé inicial do Bistek.
Apesar de fundadas em décadas diferentes, por pessoas e famílias diferentes, todas as quatro redes possuem semelhanças entre si: nasceram como mercearias ou pequenas lojas e se desenvolveram de maneira familiar.
Histórias de muita luta
“A primeira portinha foi aberta no Rio Maina, pelo seu Adolfo Manentti. Na época era uma pequena mercearia que vendia secos e molhados e, com o tempo, foi se modernizando. Não tínhamos a estrutura que temos hoje, obviamente”, declarou a diretora de Marketing dos Supermercados Manentti e funcionária da rede há 28 anos, Débora Eufrasio.
Já o Giassi surgiu também de uma “vendinha” de secos e molhados em seu início, criada por um professor que estava em busca de novas oportunidades. “Depois de nove anos nas salas de aula e buscando melhores condições financeiras para a família, busquei o desafio de abrir uma pequena loja de tecidos e ferragens. Foi um início difícil sem recursos, só com a vontade. O pouco dinheiro usado para abrir o negócio foi pego emprestado. Buscamos sempre evoluir, enfrentando as crises que eram vistas como oportunidades”, destacou o fundador da rede Giassi de Supermercados, Zefiro Giassi.
Angeloni, Bistek, Moniari e Abimar também são exemplos de redes do sul de Santa Catarina que surgiram em família. O Angeloni, como uma pequena fiambreria para a venda de carnes e frios, pelas mãos dos irmãos Antenor e Arnaldo. O Bistek, como um mercadinho de caixa único fundado por cinco irmãos, dentre eles, o atual diretor, Walter Ghislandi. Já o Abimar nasceu como um negócio de pai, mãe e filho, que é o atual gestor, Custódio Abílio da Silva.
Transformado em supermercado pelo içarense Almerindo Pizetti, o Moniari nasceu como uma rede familiar e carrega esse legado no próprio nome. “Depois que eu comprei a mercearia que era do meu sogro, comecei a tocar o mercado com a minha esposa. O nome Moniari veio depois, e é uma junção dos nomes das minhas duas filhas: Monique e Ariela”, declarou.
O serviço essencial
Se já eram considerados indispensáveis antes mesmo da pandemia de Covid-19, os supermercados ganharam ainda mais importância assim que a grande maioria dos setores industriais e comerciais tiveram que fechar as portas em Santa Catarina. Tido como serviço essencial pelo Governo do Estado, o segmento funciona não somente para abastecer as casas das famílias, como também para gerar experiências.
“A gente trabalha com aquilo que é de mais sagrado, que é a alimentação. Se fomos remeter aos momentos mais felizes das pessoas, praticamente tudo está relacionado ao supermercado. Quando se fala em Páscoa, o que nos vem em mente é chocolate. No Dia das Mães e dos Pais, é presente. No Natal, a ceia. Ano novo, champagne. Aniversário, bolo. Estamos presentes desde o acordar das pessoas até o adormecer. O café da manhã, almoço, jantar, tudo passa pelos supermercados”, ressaltou Débora.
“É inconcebível imaginar uma cidade sem a presença do varejo alimentar. Você consegue sobreviver sem ler jornal ou comprar sapato, mas não sem um supermercado para te abastecer. É uma importância para a sociedade sobremaneira, da mesma forma que ele atende as necessidades básicas, ele é um centro de experiências, é um mundo imaginário e espetacular porque te apresenta opções gastronômicas para desenvolver seus talentos”, reforçou Walter.
Além disso, muitas vezes os supermercados acabam servindo quase que como um reflexo do momento da sociedade. A maneira como a economia do país, ou da cidade, se comporta reflete no modelo de consumo nos varejos alimentares. Se tudo vai bem no país, provavelmente o consumo de carnes, por exemplo, irá aumentar “Os supermercados são quase que um termômetro para sabermos como anda a economia”, disse o diretor do Bistek.
Sinônimo de emprego
Os supermercados são um serviço ímpar em relação a importância e retorno social. Além de trabalhar abastecendo diretamente, através da venda de alimentos e produtos, os lares de milhares de famílias na região, o segmento também concede centenas de empregos que acabam se revertendo nesta compra de mercadorias. Para muitos, supermercado é sinônimo de emprego.
“O setor gera atualmente mais de 80 mil empregos em todas as regiões catarinenses. Cada loja de grande porte gera de 300 a 500 oportunidades diretas de emprego. O setor supermercadista catarinense é um dos maiores geradores de empregos e impostos para o governo. O faturamento nacional do setor foi de R$ 378 bilhões em 2019, conforme a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), o que equivale a cerca de 5% do PIB brasileiro. Santa Catarina tem cerca de 7,3% desta fatia nacional, e possui três empresas [Angeloni, Giassi e Bistek] entre as 20 maiores do país”, comentou o vice-presidente regional da Associação Catarinense de Supermercados (Acats), Nazareno Alves.
Além disso, o segmento também é uma porta de entrada para que jovens possam ingressar no mercado de trabalho. Através de programas como Jovem Aprendiz, estudantes do Ensino Médio ou pessoas de até 24 anos de idade garantem as suas primeiras oportunidades de trabalho, com horário de expediente reduzido e carteira de trabalho assinada.
“O supermercado é um criador de oportunidades porque, se parar para avaliar, é aqui onde muitos jovens de 16 anos encontram portas abertas para trabalharem”, disse Custódio Abílio. “Nós somos uma vitrine para o mercado de trabalho de maneira geral também. Muitos dos jovens que trabalham no atendimento, ali na frente de caixa mesmo, estão diariamente em contato com médicos e outros empreendedores que podem lhe dar novas chances”, reforçou Walter.
O retorno econômico dos supermercados para a sociedade também se dá na própria aquisição dos produtos que serão vendidos. Isso porque, ao comprar de produtores regionais, o segmento acaba movimentando a economia da região e contribuição para a geração de empregos indiretos.
O trabalho na pandemia
Bastaram aparecer os primeiros casos e sinais de Covid-19 em Santa Catarina para que a pandemia tivesse reflexos diretos nos supermercados. Com boa parte da população indo em massa aos estabelecimentos para estocar produtos e alimentos, o abastecimento de muitas mercadorias acabou sendo prejudicado. Ainda em meados de março, não era incomum ver prateleiras de papel higiênico, álcool em gel e outros produtos praticamente vazias, com avisos de limitação de compra para cada cliente.
“Vivemos um momento de preocupação e insegurança, pelas informações negativas e pelos riscos que se apresentavam. Em meio ao temor e ao isolamento social, como atividade essencial, os supermercados tiveram que se adaptar rapidamente e continuar trabalhando quanto muitos setores pararam. Graças à garra e à coragem dos colaboradores, conseguimos manter nosso quadro de funcionários para dar o atendimento adequado à população”, disse Zefiro.
O segmento, inclusive, virou quase que “laboratório” de análise das eficácias as medidas de segurança contra a Covid-19 no estado. Limite de pessoas, álcool em gel e aferição de temperatura nas entradas, máscaras obrigatórias e placas de proteção nos caixas. A realidade de atendimento dos supermercados virou de cabeça para baixo, de um dia para o outro, e segue em adaptação até hoje.
Inaugurada em abril deste ano em Siderópolis, ainda nas primeiras semanas de pandemia no estado, a oitava loja do P&G teve de estrear já com adaptações. “Foram seguidos todos os protocolos das prefeituras e do governo estadual e, dentro disso, atendemos os clientes da melhor forma possível, para poder tocar a operação”, afirmou o empresário Paulo Althoff.
Para o segmento, as vendas passaram por picos durante a pandemia. O consumo desenfreado no início trouxe uma alta, e o auxílio emergencial ajudou as famílias a continuarem se mantendo e consumindo nos supermercados. Para Débora, a pandemia foi responsável por uma aproximação ainda maior entre os supermercados da região.
“Nós somos concorrentes na hora da estratégia, mas durante a pandemia estivemos muito unidos. Foi um período de muita incerteza, então a gente ia se ajudando como podia. Era mercado ligando para o outro para contar se o atendimento está funcionando, se a medição de temperatura está sendo bem vista, para recomendar fornecedor de álcool em gel em uma época onde quase ninguém tinha. Estivemos unidos para garantir o abastecimento de toda a região”, pontuou.
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