A quarta edição do campeonato de skate, STU National, que ocorreu em Criciúma, neste fim de semana foi marcada por polêmica. Após tomar conhecimento dos shows que aconteceriam no Parque Prefeito Altair Guidi, o prefeito de Criciúma, Clésio Salvaro (PSD), decidiu gravar um vídeo para dizer que se houvesse apologia às drogas ou promiscuidade durante os shows, o Gilberto, funcionário da prefeitura, estaria autorizado a cortar os cabos de energia do local. Ele se referia à banda Planet Hemp e ao rapper Criolo. Os artistas faziam parte do line-up do Urb Music Tour, festival vinculado ao calendário do STU.
O vídeo foi publicado pelo prefeito na manhã de quarta-feira (20), mas desde a terça-feira, a estrutura montada para o show começou a ser sutilmente desmontada, conforme trabalhadores do local descreveram ao blog.
Foi o início de um show de trapalhadas que deu destaque nacional à Criciúma. Incomodado com a realização das apresentações, Salvaro iniciou uma verdadeira inquisição contra quem se mostrou contrário ao seu posicionamento. Vale lembrar que os shows não eram gratuitos, ou seja, quem quisesse assisti-los, precisaria comprar ingresso. Além disso, estavam previstos para ocorrer à noite e com classificação indicativa de 18 anos. Desta forma, não havia nenhuma possibilidade de que crianças estivessem expostas ao local, como disse em seu vídeo.
A partir daí a organização do evento iniciou uma verdadeira corrida contra o tempo para viabilizar as apresentações em outro local. De quarta até sexta-feira, início da madrugada, não havia nenhuma confirmação sobre o novo local. Durante a sexta-feira, Clésio Salvaro publicou um novo vídeo, recheado de grosserias que em nada combinam com o cargo de prefeito de uma das maiores cidades do sul.
“Pra ser prefeito de uma cidade não tem que ficar cheio de mimimi, não sei, talvez, pode ser que sim, pode ser que não. Não tem espaço pra prefeito boca aberta, tem que decidir”, disse no começo da publicação.
Clésio Salvaro está em seu segundo mandato consecutivo como prefeito de Criciúma. Antes disso, já passou por outras esferas do poder público e tem uma história vencedora. Atualmente, coordena ao lado de seu secretário-geral de governo, um programa milionário e histórico de entrega de obras no município e que vai deixar seu nome marcado para sempre na história da cidade, dada a relevância e o impacto de cada obra na vida das pessoas. Também investiu no turismo, inaugurando equipamentos públicos que valorizam Criciúma. O “gestor” Clésio Salvaro em nada combina com o personagem criado para animar a torcida nas redes sociais. Um personagem, diga-se de passagem, grosseiro e atrapalhado.
O cargo de prefeito não é pessoal. Clésio Salvaro está prefeito de Criciúma e se encaminha para os últimos meses de mandato. Tem pela frente a missão de eleger seu sucessor e é com isso que ele deveria estar ocupado. A internet é sedutora e, muitas vezes, distrai seus usuários, levando-os a crer que os likes são aprovação.
Salvaro não agiu como o prefeito que é. Resvalou na tentação do lacre. Fez mau uso do poder que o cargo lhe confere. Se não foi avisado pela sua equipe sobre o teor dos shows do evento que faziam parte da etapa criciumense do STU, ao tomar ciência, poderia ser o adulto da sala e resolver como adulto, direto com a organização do evento. A tentativa de dizer que “aqui quem manda é ele”, não funcionou, já que os shows, efetivamente, aconteceram e, nos moldes do que já estava anunciado: com venda de ingressos, à noite e com classificação indicativa de idade. Não se trata de defender esse ou aquele artista, mas abrir precedente para que uma apresentação artística não ocorra caso o prefeito discorde, tem nome. Chama-se censura. As regras existiam desde o início, mas Salvaro se portou como se o evento fosse ocorrer a tarde, aberto às crianças de qualquer idade. Não era o caso.
Essa é a quarta vez que Criciúma recebe uma das etapas do STU que, inclusive, é a única cidade “do interior” a fazer parte do roteiro do campeonato. E, dessa vez, se portou mesmo como uma cidade interiorana e provinciana. No marketing político, é comum a estratégia de se inventar um inimigo comum e combate-lo. Foi o que Salvaro fez. Inventou um inimigo que era a exposição de crianças a conteúdo inadequado e, logo em seguida as salvou. Só que as crianças nunca estiveram expostas a nada, neste caso.
Os shows foram realizados na casa de eventos Flor de Lis, em Criciúma e estavam lotados. Em sua apresentação, Criolo, que estava vestido de “Gilberto”, disse que onde quer que vá, pelos quatro cantos do país, não vai deixar que falem mal de Criciúma. Que cada um está lutando pelo que acredita, que está aberto ao diálogo, mas que “eles”, não. “Tem que ter maturidade, não pode misturar as coisas”, disse.
No intervalo entre as músicas, o público levantava um cumprimento pouco gentil, ao prefeito de Criciúma.
Por falar em Gilberto, o eletricista que saiu de casa anônimo na quarta-feira pela manhã, voltou famoso e, por onde passou, posou para fotos, deu autógrafos e entrevistas. Ele foi a salvação de um enredo triste de uma cidade que tanto se orgulha de seus feitos, mas se comportou como interiorana diante de um evento que projeta Criciúma para o Brasil todo. Na manhã deste domingo, durante a transmissão da final do campeonato, os telespectadores puderam ver em primeiro plano, faixas de protestos. “Contra a censura. Pela cultura”, dizia uma delas.
A gente podia ter dormido sem essa.