A história vencedora de Manoel Luiz Farias, o Neném do Varandas, não tem apenas começar cedo, trabalhar muito, acreditar nos sonhos, surpreender, superar, vencer crises, ser movido por ousadia e coragem.
Tem muitos casos que fogem ao roteiro tradicional. Como a “guerra contra as garotas”.
Neném tinha aberto o Varandas, década dos anos 90, no centro de Criciúma, ao lado do Banco do Brasil, local estratégico.
Movimento ótimo, clientes de A a C.
Um diferencial é que era o último a fechar, entrava madrugada adentro.
Atraía pelo cardápio, o ambiente e a música ao vivo. Pegava os “notívagos” e todos aqueles que queriam se soltar, comemorar, descontrair.
Isso chamou a atenção.
Numa noite qualquer, parou uma van na frente, desceu um grupo de mulheres, que se espalhou pelo restaurante.
Em princípio, apenas mulheres bonitas, bem arrumadas.
Mas, não demorou muito para ficar evidente que se tratava de “garotas de programa”, enviadas ali para tirar vantagem do sucesso do Varandas.
Neném ficou agoniado.
Ao mesmo tempo em que elas iriam consumir, e fazer consumir, portanto gerando receita, poderiam afugentar boa parte da freguesia e fazer perder receita.
Além disso, dariam uma marca ao local. Que ele não queria.
Varandas era frequentado por casais e famílias, que não se sentiriam bem, e talvez não voltassem mais, se nas mesas ao lado estivessem garotas acertando “programas”.
E a partir daí, travou-se uma das mais difíceis batalhas.
Neném decidiu começar a barrar a entrada das garotas, ou mandá-las embora.
De repente, no meio da noite, saia lá de dentro do balcão, esbaforido, toalha branca no ombro (ou na mão), e ia retirando as garotas que tinham acabado de chegar e já estavam sentando nas mesas.
Ou, quando mais rápido, já barrava na porta.
E veio o movimento de reação.
A “chefe" das garotas acionou advogado.
Era muito conhecida na cidade pela “casa" que mantinha na região do bairro Primeira Linha, onde recebia empresários graúdos e algumas das principais autoridades.
O seu nome era uma “marca”.
A “empresária da noite" sustentava que a atitude de Neném era preconceituosa e cravada de ilegalidade.
Como se tratava de local público (aberto a todos), ele não tinha o direito de “selecionar" o acesso.
E agora?
A empresária tinha a seu lado um dos principais advogados da cidade. Que, para servir a sua cliente, sustentou bem a tese sob ponto de vista jurídico.
Mas, o advogado também era amigo do Neném (e cliente do Varandas). Decidiu, por isso, trabalhar por um entendimento.
Começou sustentando aos dois, que é sempre melhor um acordo razoável, ou até um mal acordo, do que uma briga de desdobramentos imprevisíveis, com prejuízos certos para ambos.
De um lado, estava o Neném tentando “blindar” o Varandas, o negócio da sua vida.
Do outro lado, a empresária da noite, buscando ampliação da área de atuação para as suas "profissionais do sexo".
Teve boletins de ocorrência registrados na polícia, denúncias no Ministério Público, Polícia Militar acionada várias e várias vezes, processos judiciais.
Mas, o advogado insistia (e acreditava) no acordo.
Depois de muito insistir, começou a colocar frente a frente, no seu escritório, Neném e a empresária da noite.
A primeira conversa foi para cada um colocar o que estava entalado na garganta.
Tipo lavação de roupa suja.
Cada um disse tudo o que queria e pensava.
Nenhum sinal de acordo. Mas, era o previsto.
O objetivo era “quebrar gelo”.
A partir da segunda reunião, começaram a conversar.
Ela: “Mas Neném, eu que levo clientes pra ti, eu preciso trabalhar e colocar a meninas pra trabalhar, estás ganhando dinheiro nas minhas costas, deverias me agradecer”.
Ele: “Não, não. Não é assim. O restaurante tem um nome, uma marca, eu construí um nome, minha família está lá dentro”.
Ela: “O teu restaurante é o único no mundo que tem garotas de programa jantando numa mesa, e ao lado tem famílias, com pais e filhos também jantando, e todos convivendo sem problema nenhum”.
Ele: “Vocês podem ir lá jantar, não tem problema, o que vocês não podem é acertar programa no meu restaurante. Faça isso lá fora. Não posso proibir que vocês entrem para jantar, mas não posso admitir que namorem ali e acertem os programas ali. Isso causa constrangimento. O casal ou a família que vê isso, nunca mais vai volta”.
Ela: “Aponte uma situação de constrangimento que tenha sido criada por uma das meninas que vão lá”.
Ele: “Os clientes quando reclamam, reclamam pra mim. Mas, muitos simplesmente vão, não voltam mais, e lá fora falam para amigos e parentes, e isso vai minando minha freguesia”.
Conversas e conversas, mas sem fumaça branca.
Nenhuma perspectiva de acordo.
E quase todas as noites, o Neném ficava “espantando" as garotas.
Até que um dia, Neném sugeriu: “faz um local pra ti, aqui no centro, que seja até mais reservado”.
E deu-se a luz.
A empresária alugou um imóvel também na área central, próximo do Varandas, e se deu muito bem.
E o Neném consolidou seu restaurante.
Manoel Luís Farias, o Neném do Varandas, que viveu 64 anos, e deixou muitas histórias para se contar.