Estou acompanhando com um tanto de incredulidade os comentários sobre a violência ocorrida na premiação do Oscar na noite de domingo. De antemão, quero reafirmar aqui meu compromisso com a não-violência. Agora, dito isso, sinto que é mais que hora de termos pés bem fincados na diferença entre não-violência e passividade.
Jada Pinkett Smith foi vítima de violência de gênero cometida pelo apresentador que ocupava o palco de um dos eventos mais acompanhados do mundo. O dito humorista com histórico na piada que faz graça em cima da dor zombou de uma questão de saúde de Jada, a respeito da qual ela já vinha compartilhando seu sofrimento, e ainda em cima da longa luta travada para que os cabelos da mulher negra – e ela própria – possam ocupar espaços como aquele.
Entre quem vestia roupas de grife e ocupava seu lugar em frente às câmeras, e quem assistia nas transmissões ao vivo no mundo todo, o riso fez coro quase unânime. Jada fez silêncio, mas como se deveria reagir à violência inesperada? Como se deveria reagir à algo que passa como risível aos ouvidos dos demais?
O companheiro, a quem a noite era especialmente importante, mas que também compreendia parte da dor de Jada, não se absteve. Marcou, com as estratégias que conhece ou que lhe foram possíveis naquele momento, a violência sofrida. Bancou o risco. Diluiu o riso. Produziu incômodo para além daquele instaurado sobre Jada.
Pensemos sobre a forma. Reflitamos sobre os porquês de não haver nada além de um murro na cara para ofertar naquele momento. Nos comprometamos com uma educação que instrumentalize pessoas para usar da palavra até às últimas consequências. Mas não igualemos, nunca, jamais, a violência e a defesa.
Em última instância, o que eu vejo naquela cena é que somente uma pessoa se levantou e agiu no sentido de reestabelecer o limite frente ao intolerável: a violência do tal apresentador e de quem, com ele, achou graça.