Assistindo ao programa Paesi che Vai sobre os tesouros de Pádua, na Rai International, me ocorreu escrever sobre o Juízo Final. Reginaldo degli Scrovegni, rico e usurário, pelas suas más ações foi colocado no sétimo círculo do inferno na fabulosa Divina Comédia de Dante. Na Idade Média o pecado era considerado muito grave, condenando o pecador à danação eterna, conceito que sobre certo aspecto persiste até os nossos dias. Seu filho Enrico construiu uma capela em Pádua e contratou Giotto para decorá-la, uma tentativa de expiar os pecados do pai. Giotto, o primeiro pintor a romper com a tradição medieval de pinturas estáticas, pintou afrescos maravilhosos dando a impressão de profundidade em uma superfície bidimensional. O Juízo Final, no altar da capela, retrata Cristo no paraíso condenando os pecadores e concedendo aos eleitos a bem aventurança eterna.
Hieronimus Bosch, no seu famoso tríptico O Jardim das Delícias Terrenas, retrata o paraíso no painel da direita, o julgamento no centro e a condenação dos pecadores no painel da esquerda (direita do espectador). Bosch era um moralista com uma visão pessimista da humanidade, julgando que o ser humano, pelos atos que praticava, estava definitivamente condenado às trevas. Os temas dos quadros de Bosch são alegorias sobre os pecados, as virtudes e a insensatez dos seres humanos. Sua pintura era tão bizarra que elementos fantásticos, demônios, criaturas meio humanas, meio animais, povoavam um ambiente arquitetônico e paisagístico imaginário. Suas obras influenciaram os poetas simbolistas e pintores expressionistas e surrealistas. O perfil psicológico de seus personagens também auxiliou Freud a desenvolver seus conceitos psicanalíticos.
A fachada do Duomo de Orvieto - uma transição do românico para o gótico - é uma das mais belas da Europa. Na Capela San Brizio está a obra-prima de Luca Signorelli, uma série de enormes afrescos sobre o apocalipse e o juízo final. A Ascensão dos Justos para o Céu, a Queda dos Condenados no Inferno e a Ressurreição dos Mortos são retratadas. A obra do pintor caracteriza-se por rigoroso estudo anatômico, enfatizando os nus e dando realce à musculatura. Sua precisão certamente revela dissecções em cadáveres, proibidas na época. SIgnorelli participou da decoração das paredes laterais da Capela Sistina juntamente com Botticelli, Perugino, Ghirlandaio, Pinturucchio e Rosselli, contratados pelo papa Sisto IV, que deu origem ao nome da capela.
Michelangelo se inspirou nos trabalhos de Signorelli para compor o magnífico Juízo Final, trinta anos após concluir o teto da Capela Sistina. Utiliza o mesmo recurso dos pintores que o precederam, colocando Cristo no centro da composição julgando os vivos e os mortos. No entanto não tem uma visão tão severa e implacável em relação aos condenados. Os eleitos sobem para o céu o os condenados aguardam o barqueiro Caronte que os conduzirá ao inferno. O artigo “Orelhas de Burro, o Juízo Final e Il Braghettone”, sobre o mesmo tema, pode ser acessado. Clique aqui.