Na comunicação existe uma máxima não catalogada em nenhum livro técnico sobre o assunto que diz que ao falar sobre um determinado tema, o emissário sempre deve se perguntar: “a Dona Maria entenderia com facilidade o que estou dizendo?”. Se houver dúvida sobre a resposta, volte e refaça a linha de comunicação. O governo federal não se perguntou como a “Dona Maria” entenderia a informação sobre a fiscalização da Receita Federal sobre a modalidade mais usada da atualidade para pagamentos e transferências de dinheiro: o pix.
Ficou fácil demais surfar na fragilidade da comunicação do governo Lula. Mas não só isso. Para além de um anúncio mal feito sobre a nova regra sobre a fiscalização, um outro fator colaborou para que a oposição tivesse a maior vitória até o momento. O governo Lula, de fato, tem buscado aumentar a arrecadação a todo custo e, na grande maioria das vezes, mirando o recolhimento de impostos nas fatias mais pobres da população. Lembra da taxação das compras das brusinhas? Em vigor desde o dia 1º de agosto, a Lei 14.902/2024, que estabelece a taxação de compras internacionais de até US$ 50, valor compatível com compras feitas em sites de fast fashion como a Shein.
Portanto, quando o deputado federal de oposição, Nikolas Ferreira gravou um vídeo e apontou as fragilidades da proposta do governo, a mensagem se espalhou feito rastilho de pólvora. Nikolas não gravou aquele vídeo à toa ou sem um bom roteiro. Ele usa gatilhos mentais que sempre funcionam como é o caso do medo, além de fazer a melhor pergunta que um político poderia fazer para se conectar com as classes menos favorecidas. Ele diz: “o governo quer saber como uma pessoa ganha 5 mil por mês e gasta 10 mil no cartão. Mas não quer saber como uma pessoa que ganha um salário mínimo faz para sobreviver, pagar água, luz, moradia, educação e compras do mês”.
Todo brasileiro que precisa se desdobrar para conseguir pagar suas contas, se identificou com o vídeo e foi a partir daí que a situação (para o governo) saiu do controle. O primeiro erro foi não ter sido claro na mensagem inicial, já que, por exemplo, desde 2015, bancos e cooperativas de crédito, informam à Receita a movimentação financeira a partir de 2 mil reais de seus clientes Pessoa Física e de 6 mil reais, para Pessoa Jurídica. A partir dessa Medida Provisória, o valor aumentaria para 5 e 15 mil, respectivamente. Enquanto a oposição soube aproveitar a crise, o governo federal não conseguiu alinhar nenhuma estratégia eficaz para desfazer o estrago. Desde o início de janeiro até agora, as transações feitas via pix caíram 10%, em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo o jornal O Globo. A MP foi revogada, mas não saiu de pauta. A taxação de transações digitais não é tema novo. Foi abordado pela primeira vez em 2019 pelo então Ministro Paulo Guedes. Ele também foi alvo de críticas e a ideia não foi pra frente. Após a repercussão do vídeo político mais visto da história no Brasil, Nikolas Ferreira voltou às redes e disse que “com um fundo preto e sem verba pública, nunca subestime o poder de um vídeo”. Foi a pá de cal numa comunicação analógica, perdida e que há dois anos não consegue se conectar com os brasileiros.
Ah, e o pix não seria taxado, por que isso é inconstitucional. Nesta quinta-feira (16) o governo federal editou a Medida Provisória (MP) 1288/25, que tem como principal objetivo reforçar a regra que proíbe a cobrança de taxas em transações financeiras via Pix. O texto está sendo analisado pelo Congresso Nacional. Resta saber como o governo vai se recuperar do desgaste que furou a bolha política e alcançou o país inteiro.