Não é de hoje que a amizade entre o prefeito de Chapecó, João Rodrigues (PSD), e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) desperta curiosidade nos bastidores da política catarinense. Eles estão em partidos diferentes, sim. Mas se conhecem há anos, compartilham ideais conservadores e mantêm uma relação de confiança que, à primeira vista, justificaria qualquer alinhamento. Só que política não é feita só de afinidade. É feita de cálculo. E, neste jogo, cada peça se move conforme as circunstâncias. João Rodrigues lançou sua pré-candidatura ao governo do estado no fim de março, com o discurso de quem quer percorrer Santa Catarina e apresentar seu projeto aos eleitores. A próxima parada está marcada para Criciúma, no fim de maio. Tudo dentro do roteiro de uma candidatura em construção.
Só que outros elementos passaram a compor o cenário, especialmente uma fala que veio de Brasília. Jair Bolsonaro, em uma reunião política, disse ainda ter “esperança” de que João concorra ao Senado — e não ao governo. E justificou: gostaria de lançar apenas uma candidatura da direita em Santa Catarina. Tradução: evitar dividir o eleitorado entre João Rodrigues e o atual governador Jorginho Mello (PL), integrante de seu partido.
Mais do que um gesto de preferência pessoal, o recado de Bolsonaro tem ares estratégicos. O ex-presidente quer uma base robusta no Senado para defender suas pautas — entre elas, a possibilidade de abrir processos contra ministros do STF. Para isso, precisa eleger nomes alinhados em cada estado. E, nesse contexto, não há espaço para duas apostas concorrendo entre si.
A pressão é clara. João Rodrigues tem até abril do ano que vem para renunciar à prefeitura, caso mantenha a intenção de disputar o governo. A legislação diz que chefes do Executivo que desejam concorrer a outro cargo precisam deixar o atual até seis meses antes da eleição. Mas antes disso, terá de tomar uma decisão difícil. Bolsonaro não vai dividir palanque. E a tendência é que feche com Jorginho, do seu partido, sem titubear.
Neste ponto, a lealdade pessoal será posta à prova pelo pragmatismo político. João Rodrigues precisará avaliar o custo-benefício de seguir com a pré-candidatura ao governo — sabendo que pode enfrentar resistência do bolsonarismo — ou recuar e aceitar disputar o Senado, como preferem alguns de seus aliados e o próprio ex-presidente. Essa escolha não será solitária. A articulação do PSD, em especial a liderança do presidente da Assembleia, Júlio Garcia, terá papel decisivo nesse tabuleiro. E o que está em jogo vai além do destino político de João Rodrigues: é a própria configuração da disputa majoritária em Santa Catarina.
A amizade com Bolsonaro, ao que tudo indica, continua firme. Mas no jogo político, como bem se sabe, amizade não garante apoio. E nem sempre os caminhos dos amigos se cruzam no mesmo palanque.