Nesta terça-feira, 3, o caso da promoter Mariana Ferrer, a qual afirma ter sido estuprada pelo empresário André Aranha, voltou a ganhar repercussão nacional e pautar discussões em inúmeras esferas. A discussão vem acompanhada das imagens do julgamento apresentadas pelo site The Intercept Brasil, que mostram a vítima sendo praticamente humilhada pelo advogado de André, representando a decisão de absolvição do empresário com o termo “estupro culposo”.
Apesar de ser amplamente levantado e discutido, o termo “estupro culposo” não foi apresentado pelo juíz ou pelo Ministério Público durante o processo, mas sim utilizado pelo The Intercept para exemplificar a decisão apresentada pelas autoridades.
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“Não existe o tão falado estupro culposo. Sendo o mais didático possível, no ordenamento jurídico brasileiro temos a possibilidade do crime ser praticado de maneira dolosa, quando há intenção, e de maneira culposa, quando não há. No criem de estupro, somente se admite o dolo, quando a pessoa tem intenção de praticar o crime, e é impossível que alguém estupre outro sem que tenha a intenção. A expressão [estupro culposo] foi ultizada pelo The Intercept, com a intenção de resumir o caso e explicá-lo ao público leigo”, declarou o advogado criminalista, Dr. Antônio Frederico Salfer.
O caso vem sendo tratado como estupro de vulnerável, em que a vítima não teria condição de autorizar o ato ou oferecer resistência. A decisão do juiz e do MP, então, vem sob a tese de que o acusado não teria como saber que a vítima estava sobre uso de algum intorpecente, droga ou palcool e que, por isso, não poderia ter cometido o cirme de estupro de vulnerável - calhando, então, no termo de “estupro culposo” apresentado pelo The Intercept.
O julgamento, então, acabou caindo no chamado “erro do tipo”, por supostas faltas de prova. “O erro do tipo é quando há um erro sobre elemento constitutivo do tipo, neste caso, a vulnerabilidade da vítima excluiria o dolo, mas permite a punição por crime culposo. Se há erro de tipo num crime de estupro de vunerável, que não tem tipo culposo, acabaríamos numa absolvição por não ter esse dolo”, pontuou a advogada criminalista Sara Pessoa.
A sentença do poder judiciário, vazada na íntegra pelo site O Antagonista na noite de ontem, aponta que: não havia provas contundentes do estupro de Mariana Ferrer a não ser a fala da vítima. A dissonância entre os depoimentos colhidos na fase judicial conduzem a dúvida quanto a autoria dos fatos narrados na exordial acusatória, não podendo, por isso, ser proferido o decreto condenatório, devendo a dúvida ser dirimida em favor do acusado com amparo no princípio de pro réu.
No documento, ainda consta que: da análise das imagens, é possível perceber que a ofendida durante todo o percurso mantém postura firme, com excelente resposta psicomotora, cabelos e roupas alinhadas e mesmo calçando salto-alto, consegue utilizar o aparelho telefônico durante o percurso. Percebe-se claramente que a ofendida possui controle motor, não apresenta distúrbio de marcha característico de pessoas com capacidade motora alterada pela ingestão de bebida alcoólica ou substâncias químicas. Confira a sentença na íntegra:
O julgamento divulgado
Por ser um processo que está sendo tratado em segredo de justiça, não há acesso a todos os autos e imagens do julgamento. O vídeo publicado pelo The Intercept, no entanto, mostra o advogado de André praticamente humilhando Mariana, sem a interferência, inclusive, do próprio juiz.
Durante a defesa do acusado, o advogado de André traz imagens que não dizem respeito em nada ao caso em si, quase que desmerecendo a vítima que, até a noite do ocorrido, era virgem. “A atuação do advogado chocou o país, porque ele traz fotos e fatos que não tem nada a ver com o caso concreto, querendo dizer que por ela ser uma promoter e trabalhar com sua imagem, daria causa a ação. O que essa história tá dizendo que a culpa da violência, é da vítima”, declarou a adcogada cofundaddora da Rede Feminista de Juristas, Isabela Guimarães Del Monde.
Provas e declaração da vítima
Isabela reforça que, dentre as provas apresentadas por Mariana, estão vídeos que mostram ela andando de maneira cambaleante e até mesmo depoimentos de terceiros. “Há mensagens dela confusa com as amigas, depoimento da mãe que a recebeu em casa logo depois que ela voltou do trabalho. E temos que perguntar: a pessoa que preserva sua virgindade até os 21 anos, no século XXI, é evidente que é alguém que vê nisso um valor, e seria muito inverossímil acreditarmos que alguém que preservou sua virgindade até os 21 fosse perdê-la com um homem desconhecido numa festa”, disse.
O processo de julgamento do caso contra André Aranha vem se arrastando desde 2018. Desde então, Mariana mantém o seu depoimento. Em um primeiro momento, a decisão do Ministério Público era a favor da prisão preventiva do acusado - o que acabou mudando drasticamente, para a absolvição deste, após a troca de promotor do caso.
“O que o MP poderia ter feito, já que não seria possível comprovar a vulnerabilidade, pedindo a condenação pelo crime de estupro simples, mas a opção feita pelo MP foi de pedido de abolsvição. E aí isso que nos chamou atenção, considerando que o MP é o órgão dono da ação penal, foi ele quem resolveu iniciar uma ação penal contra o Aranha e que, num primeiro momento, era uma ação que pedia a condenação dele”, disse Isabela.