O "novo normal" também dá a suas caras no futebol. Sem jogar desde 15 de março - quando venceu o Joinville por 1 a 0 fora de casa - e voltando aos gramados exatamente quatro meses depois da última partida no Heriberto Hülse - em 8 de março, 0 a 0 com o Figueirense, e nesta quarta encara o Marcílio Dias no Majestoso -, o Criciúma está se munindo de informações para conviver com os novos desafios impostos pela pandemia de Covid-19.
"É muito difícil. Esse protocolo eu sou contra, teve algumas invenções. Há pouco veio a informação de que não podemos nem fazer a oração no vestiário, juntos, de mão dada. Antes e pós jogo. Não pode", reclamou o técnico Roberto Cavalo, em entrevista ao programa Agora, na Rádio Som Maior, nesta terça-feira, 7. "Se não pode tudo isso aí, é que tem grande risco", observou.
O Criciúma tem sido bastante rigoroso com o atendimento às regras. Depois dos treinos, os atletas nem utilizam os chuveiros do CT Antenor Angeloni. Vão sujos para casa. "A pedido do presidente respeitamos todo o protocolo. Fiquei alguns dias no CT, triste com nossos atletas, com chuva e frio você sai do treinamento, tem que pegar o carro e ir para casa. O atleta sai sujo, o corpo esfria, é risco de pegar uma gripe, e temos lá no CT uns 30 chuveiros e não pode utilizar após o treino. Isso é muito errado em termos de protocolo", referiu Cavalo. "A chegada nossa é sempre com exames, um bom trabalho", completou.
Jogadores em dúvida
Os atletas estão com muitas dúvidas sobre o comportamento dentro de campo. "Ontem fizemos a bola parada com todos dentro da área, agora está liberado para coletivo, antes era muito rígido. Liberou de uma forma que considero um risco", relatou Cavalo.
E a incerteza ficou ainda maior com a confirmação, nesta segunda-feira, 6, de que o técnico do Marcílio Dias, Moisés Eggert, está contaminado pelo novo coronavírus. "Tivemos um caso com treinador do Marcílio Dias. Ontem foi perguntado na roda, dentro do campo, pelos atletas, conversamos sobre cansaço e teve um que se manifestou, não vou citar nome, que perguntou como estão as equipes, nós e o Marcílio, se faremos exames antes de entrar em campo. O Marcílio teve um caso, isso preocupa e deixa na mente do atleta uma preocupação", comentou Cavalo.
Esse comentário no grupo, antes do treino da tarde passada, motivou uma conversa do médico Ricardo Furtado com os jogadores. "Nesse momento eu chamei o dr Ricardo, ele foi no campo, deu um parecer rápido e hoje ele teria uma informação mais detalhada, ia entrar em contato com a Federação para ver como vai funcionar. Isso preocupa os nossos atletas. Não que causa medo, mas existe a preocupação", reforçou o treinador tricolor.
Contra o Marcílio, como será?
O adversário desta quarta-feira é justamente o técnico que perdeu momentamente o seu técnico, com diagnóstico positivo de Covid-19. "O Moisés ficou uma semana fora, quando teve o acidente lá, que o Gelson levou 15 pontos na cabeça, ele não estava junto, ele estava afastado. Depois, quando ele foi retornar, deu positivo nos exames. Essa preocupação é porque, como todo mundo é isolado, nós conversamos com o médico. Se um atleta tiver e passar para outro atleta, o atleta do Criciúma será afastado, mas e os demais?", questionou Cavalo.
Outra preocupação é que Itajaí, onde o Criciúma estará no domingo para o jogo de volta contra o Marcílio, é uma das cidades que lidera as estatísticas de Covid-19 em Santa Catarina. "Não é fácil. Quer queira, quer não, é um vírus que vem aumentando, muito forte em Itajaí, nosso adversário de amanhã. Temos que ter precaução. Por isso o dr Ricardo está buscando as melhores informações, para a gente entrar em campo seguros e tranquilos, para fazer um grande jogo. Mas saúde em primeiro lugar", relatou o técnico.
Itajaí é a segunda cidade catarinense com mais óbitos por Covid-19 conforme o relatório divulgado nesta segunda-feira pela Secretaria de Estado da Saúde. São 41 mortes, cinco a menos que em Joinville. Em relação aos casos, Itajaí é a quinta cidade com mais registros, com 2.080 pacientes positivados.
Vai conseguir concentrar
Mesmo com todas as ressalvas, agora é possível a concentração dos times de futebol. É o que o Criciúma fará a partir do fim da tarde desta terça. Já o Marcílio precisará lidar com um protocolo mais complexo na sua vindo para o sul do estado. "A concentração, no protocolo inicial, não poderia. Daí entramos em contato com a FCF, o Marcílio Dias tem que ficar em hotel. No protocolo inicial constava dois ônibus, não sei se o Marcílio viajou assim. E a concentração é no hotel. A FCF autoriza concentrar, e nós vamos concentrar hoje após o treino da tarde. Mas no protocolo original não poderia", destacou Cavalo.
Se não podem usar os chuveiros do CT depois dos treinos, os atletas pelo menos poderão tomar banho no Majestoso depois do jogo desta quarta. "Isso aí pode. Agora pode. Liberou né. Antes não podia. E a recuperação de gelo também. O atleta cansado. Nós fomos obrigados a apertar mais os trabalhos, com carga maior, dois períodos, o atleta precisa da recuperação de gelo, e não podia entrar no gelo, o protocolo não deixava. Também não fizemos. Conversamos com os atletas, temos as bolsas para a recuperação em casa. Foi uma mão de obra mais difícil, espero que dê resultado com vitória amanhã", frisou. "É um vírus que está totalmente escondido, não sabemos onde anda, está pegando em muitos lugares, aumentando a cada dia", emendou.
Mas e na bola rolando? "E na área, quando tem escanteio? O jogador vai estar abraçado lá, com o suor, e como faz?", insistiu o treinador, sem esconder a preocupação.
A volta do Catarinense
A retomada do Campeonato Catarinense será nesta quarta. Mas Roberto Cavalo pondera que esse retorno se dá no momento em que o vírus parece mais atuante em Santa Catarina. "Eu vejo que o campeonato já tinha ameaçado começar até um pouco antes, não tinha um vírus tão forte no estado. Estamos tomando essas iniciativas pois Rio e São Paulo mandam, seguimos muito eles. O Rio começou, está em andamento, São Paulo ainda não definiu, no interior de São Paulo está muito forte o Covid. Aqui no estado é o momento mais forte, pelo que acompanhamos na mídia, é bem forte esse vírus", observou.
O treinador admite que falta tranquilidade para a bola rolar com segurança. "Não temos a convicção de que pode jogar tranquilo, vamos pagar para ver. Estamos treinando dentro da lei, do protocolo, o que orientamos é que todo o atleta, quando chega em casa, tem que ver com a esposa, a família, se saiu, preocupação com a higiene. Pedimos cuidado especial", salientou. "Quando chega no CT é feito o exame, no estádio também. A preocupação é dentro de casa", sublinhou Cavalo.
Há restrições também no número de envolvidos na partida no entorno do gramado. "Dentro do campo temos restrições, só pode dez da comissão técnica, e temos vários profissionais. Tudo isso já veio para nós, e dentro de campo os atletas que estarão envolvidos. O protocolo não deixa fazer uma oração antes e nem depois, isso deixa crer que algo tem no ar", referiu. "O atleta dentro de campo, com marcação individual, vai ser complicado. É um protocolo diferente. Eu questionei muito isso. Se é hora, não sei, mas vamos estar preparados para jogar amanhã", reforçou.
A volta
Com muitos anos de experiência no futebol, Cavalo lembrou que nunca viu, e provavelmente nunca verá, um acontecimento semelhante. "Acho eu que não vai acontecer mais no mundo do futebol uma pandemia como essa. O futebol parou desde 15 de março, quando jogamos em Joinville e fizemos um grande jogo, trouxemos um resultado de 1 a 0 muito válido. Daí parou o campeonato. Em 100 dias muda muita coisa", lembrou, enfatizando o tempo de bola parada no Estadual.
Antigamente, a paralisação era bem menor, em circunstâncias normais. "Quando eu jogava nós tínhamos nem 30 dias de férias. Dezembro se passava Natal e Ano Novo e já tinha que se apresentar, agora parou 100 dias. Foi uma temporada totalmente diferente e com esse recomeço, não é a mesma coisa, vai ter diferença. Por mais que os atletas fizeram algum trabalho em casa, não é a mesma coisa que estar em dois períodos em campo, sendo exigido", destacou.
Para Cavalo, essa pausa vai sim mudar o ritmo do campeonato, que não retornará com os times na condição anterior à pandemia. "Vai ter diferença sim. Espero que do nosso lado seja positivo. Na parte física, ficamos muito satisfeitos nos treinamentos com o nosso preparador físico, um trabalho muito bom, os jogadores correspondendo, buscando o ideal. Na parte técnica eu e o Wilsão posicionando o time, cobrando intensidade, ficou um time rápido, leve. A equipe deu uma melhorada boa", refletiu. "É um jogo decisivo, de 90 minutos, temos que ser inteligentes para saber vencer esse mata-mata", projetou.
Criciúma x Marcílio Dias jogam às 19h desta quarta no Heriberto Hülse. A cobertura do Timaço da Rádio Som Maior começa às 18h. Ouça, no podcast, a entrevista de Roberto Cavalo: