No 24 de outubro, completaram-se 64 anos do falecimento de papai, que se foi em 1959. O eterno doutor Manoel Telésforo Machado, como todos o chamavam, respeitosamente. Menos, curiosamente, duas pessoas - segundo assisti várias vezes: o Camilão, um amigo de infância dele e notório em Araranguá e um esmoleiro também do Araranguá, com quem papai batia longos papos nas manhãs de sábado, na frente da casa, sentados em cadeiras especialmente colocadas. Porque em todos os sábados, papai trocava dinheiro e juntava nota por nota para ofertar aos esmoleiros, como caridade habitual. E eles sabiam da rotina e se enfileiravam na frente de casa. Só aquele esmoleiro, especialmente, permanecia ao fim de tudo pra conversar. E, sim, tratava papai com intimidade: era "Telésforo" e não "doutor Telésforo" ou "doutor Machado". Riam alto de piadas que jamais entendi. Chamava-se Campolino. Personagem incrível.
Assim era papai. Não com todos. Com alguns especiais. De resto mantinha o estilo formal. Ele advogou no Araranguá, em Conceição do Arroio (RS), Criciúma, Turvo e Urussanga. Espichou por lá as teias de sua atividade. Em Criciúma, representou como advogado a CBCA (Companhia Brasileira Carbonífera de Araranguá).
Em Araranguá, advogou para a Força e Luz, do seu amigo Padre Antônio Luiz Dias, seu criador, e o senhor Leitão, um português da gema.
Papai tinha uma história danada de profunda com o Araranguá: foi um de seus primeiros advogados e um de seus primeiros professores. Sua inscrição na OAB-SC era número 8. Seus vínculos pessoais com personagens da história da cidade foram mantidos sempre. Ele é parte da história.
Há muita coisa a relembrar e a dizer sobre papai. E sempre repito ladainhas saudosas em todos os 24 de outubros ou 5 de janeiros, data do seu nascimento, em 1878. E o faço como coisa nova, sempre. Pois a sua imagem se renova a cada dia e a cada momento, ungidas em mim pelos exemplos que me deixou.
As outubro me traz outra lembrança muito atual: meu casamento “de papel passado” com Dona Sonia, após 10 anos de vida em comum. Com desnecessidade formal, mas só para receber o PIS em nosso nome. Porque naquele tempo só se recebia dinheiro do PIS se morresse (estava – ainda está – fora dos planos imediatos), aposentasse (e naquele tempo ainda era distante) ou casasse. Então, rigorosamente, casamos por interesse financeiro. Foi uma salvação da lavoura pra pagar dívidas, desgraça que sempre nos perseguiu e persegue. Embora se saiba que esta é uma irmandade grande e de amplitude nacional.
E com essas duas lembranças diametralmente opostas e de diferentes significados, fico por aqui. Ademã, que cavalo não sobe escada, como dizia Ibrahim Sued.