Papai, o Senhor Doutor Manoel Telésforo Machado, exerceu a advocacia por quase 60 anos, no sul de Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Era provisionado ou não formado. Sua inscrição na OAB-SC, lembro bem, era número 8. No entanto, advogados, juízes e promotores de Justiça nutriam por ele admiração, pois seus conhecimentos iam muito além dos bancos acadêmicos. E até o consultavam ante dúvidas, pois sua imensa biblioteca jurídica tinha exemplares e coleções inéditas. Estudioso, o Doutor Telésforo falava alemão, italiano, francês ("A Retirada da Laguna", do Visconde de Taunay, em francês, ele o leu várias vezes), conhecia o latim como poucos e, claro, era mestre acabado e reconhecido na língua portuguesa. Castiço de fio a pavio. Se horrorizava com erros de escritas e de fala. E corrigia na hora. No entanto, não o fazia em público e mantinha relação de amizade com muitas pessoas humildes, portanto nem tanto letradas, e com elas conversava, relevando seus linguajares simples e até simplórios. Seguia a trilha, apenas. Tinha essa noção rica do seu lugar e do lugar dos outros.
Foi um pai enérgico, no entanto, jamais bateu num filho. No máximo levantava a voz um pouquinho e lá se ia a gente. Enérgico e vitalmente preocupado com nossa segurança, saúde e felicidade. Nos deu liberdade plena. A ponto de, quando os filhos, todos à minha exceção (ele faleceu quando eu tinha 15 anos), queriam liberdade para fazer e ser o que quisessem, ele concedeu. Com um detalhe: cada um por si. E nenhum deles ficou sob sua guarda direta além dos 18 anos. Todos saíram para levar pancadas da vida e se fazer - e levaram muitas. Só Icleia, a única filha mulher, saiu quando completou 18 anos por casamento.
Poderia falar mais sobre o Doutor Telésforo e sua personalidade cativante e misteriosa até para nós, filhos. Levaria tempo demais.
Porém, este registro não é apenas para isto, mas para marcar este 24 de outubro. Foi o dia de sua partida. Ele se foi neste dia, em 1959, às 7 horas da manhã, num quarto do Hospital Bom Pastor, no Araranguá, aos 81 anos, praticamente a minha idade atual. Em 1980, mamãe também faleceu, num 1º de novembro, num quarto exatamente à frente daquele. Um detalhe guardado por mim até hoje. Seus liames estavam também ali. Por isso ambos estão sepultados numa mesma tumba.
As lições dele são indeléveis. Espero ter herdado algumas e as aprendido como deveria.
Dos seus cuidados conosco, guardo um cartão que escreveu, endereçado ao então Inspetor Escolar Otávio Munir Bacha, agradecendo por sua atenção para comigo. Ano de 1957, meus 13 anos e estudante do Grupo Escolar Castro Alves, do Araranguá (atenção à caligrafia):