Uma semana longe do blog. Uma semana longe do trabalho. Uma semana depois de quatorze anos. Vou explicar melhor…
Pelas minhas contas, em quatorze anos, foram treze ginecologistas - a maior parte deles recomendou atividade física ou uma vida com menos estresse, afinal, “a dor é psicológica”. Desculpem, eu não contei as idas ao pronto socorro, afinal elas sempre resultaram em soro+receita.para.qualquer.remédio.para.dor. Por escolha, decidi não contar também as vezes que ouvi que “vida de mulher é assim mesmo” ou que “ninguém desmaia de dor”, que “cólica é normal”. Fiz um esforço para esquecer as expressões das pessoas que me viram chorando, aparentemente julgando minhas reações como exageradas ou histéricas. Também não contabilizei as vezes em que fui para o trabalho, mesmo sem ter condições de trabalhar, porque “cólica não é motivo para atestado médico”. Aí, na semana passada, recebi um diagnóstico: endometriose. Com ele, uma indicação cirúrgica.
Ainda em recuperação, decidi vir aqui compartilhar com vocês o que aprendi nos últimos dias:
Grosso modo, endometriose é uma doença que se instala no útero, nos ovários, nas trompas e em outros órgãos abdominais, quando o endométrio, que deveria ser expelido pela menstruação, migra no sentido oposto e se aloja na cavidade abdominal. Além das cólicas insuportáveis, os sintomas de endometriose incluem dor abdominal e pélvica, dor durante a relação sexual, sangramento menstrual intenso ou irregular, alterações intestinais ou urinárias durante o período menstrual e dificuldade para engravidar ou infertilidade. É uma doença crônica, que não tem cura, mas que tem um bom prognóstico após a intervenção cirúrgica. Na ausência de diagnóstico e tratamento, pode levar a morte.
Apesar da seriedade, um estudo da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia identificou que 53% das mulheres nunca ouviram falar da doença. O mais impressionante, no entanto, é que os médicos também estão pouco familiarizados (será?) com a endometriose: em média, as mulheres passam por seis médicos e demoram de sete a dez anos para serem diagnosticadas e, obviamente, tratadas.
Outro ponto, importante para mim como psicóloga, é que sim, existem dores causadas pelo estado psicoemocional, mas, vocês sabem, também existe a dor física. Ao mesmo tempo em que percebemos uma resistência na sociedade e, ainda, na medicina, com as questões psíquicas, usamos deste título para justificar aquilo que não compreendemos - ou que não desejamos compreender. Além de postergar um adoecimento que poderia facilmente ser tratado se diagnosticado no início, causa uma outra dor: a dor de ser responsabilizada pelo seu sofrimento (lê-se: eu estou exagerando, eu estou criando esta dor… e, se eu crio, posso também dar fim à ela).
Não posso, ainda, me furtar de citar a responsabilidade cultural e social, afinal, talvez seja apenas o velho hábito de rapidamente qualificar as mulheres como “histéricas” ou “exageradas”. Além do mais, vocês já viram algum homem sofrendo com dor? Ao que parece, isso não costuma acontecer (espero que vocês leiam a ironia aqui).
Enfim, este texto é uma tentativa de:
1. Dizer que dor é dor, e que a única pessoa capaz de medi-la é quem a sente.
2. Alertar que cólicas não são normais e que existe uma doença - e seu respectivo tratamento - que dará fim ao que você sente.
3. Recomendar a Manu (Dra Manoela Vieira Bez), ginecologista que me acolheu, ouviu e descobriu o que eu tinha, e a Joana (Dra Joana Scheidt), cirurgiã que me operou. Dobradinha de sucesso que está me permitindo dormir com a sensação de que, no final do próximo ciclo, o que virá, realmente, vai ser o normal.
Quanto ao blog, obrigada por compreenderem a ausência. Como eu, ou seja, como alguém que se ausenta de repente e precisa voltar aos poucos, ele está voltando a atividade.