Outubro começou e - não podia ser diferente - falamos neste primeiro Fica a Dica do mês sobre a campanha outubro rosa e a condição psíquica em torno do câncer de mama.
Costumo dizer que doenças graves são como carimbos no nosso passaporte da vida: quem ganhou esse carimbo, passou, portanto, a conhecer outro lugar, diferente dos até então conhecidos. Assim, podemos pensar que as doenças dividem as pessoas em dois grupos: as que têm saúde e as que têm doença. A doença oncológica, neste caso, é uma ruptura no ciclo de vida planejado pela mulher e pode trazer inúmeros questionamentos: o tempo passa a correr diferente, os dias seguintes após o diagnóstico se tornam de outro tamanho... É bastante comum que a mulher inicie um processo de volta aos significantes pelos quais fez sua trajetória, ou melhor, que ela reviva e ressignifique sua história de vida.
Enquanto isso, a medicina continua se ocupando daquilo que faz bem: da utilização de instrumentos cada vez mais precisos na condução de diagnósticos das patologias orgânicas. É fato que as doenças estão nos livros, nos protocolos, nas lâminas dos microscópios e cada vez mais se descobrem avanços para o seu tratamento - e que ótimo, não é mesmo? Mas somente quando a doença encontra um corpo, produz o sofrimento, seja ele qual for. As doenças podem até ser iguais, os protocolos também, mas o sofrimento é individual, subjetivo e único. Por isso, falar de câncer de mama é falar também da psiqué daquela que o descobriu, do sofrimento que vem do diagnóstico, do convívio e até do tratamento da doença.
A mulher diagnosticada com câncer de mama convive com o medo de ser estigmatizada e rejeitada ao tomarem conhecimento de sua doença, com a possibilidade de disseminação da doença pelo seu corpo, com a queda do cabelo e o efeito disso sobre sua autoestima, com a incerteza quanto ao futuro, com o medo da recidiva... Sabemos também que uma das principais dificuldades das mulheres em tratamento oncológico é lidar com a retirada do seio. Ora, se o pênis é a parte do corpo que identifica o homem, percebemos que são os seios o símbolo da relação identidade-corpo na mulher. E, como nosso quadro no Jornal das Nove é sobre relacionamentos, vamos falar deles, que entram justamente aqui: como você, parceiro ou parceira desta mulher, tem lidado com esta ideia ou até mesmo com a mutilação que ela sofreu/sofrerá? Como você pode participar de forma positiva? É importante sempre lembrar que redes de apoio são fundamentais no enfrentamento de qualquer situação difícil, inclusive no câncer. Por isso, além de todas as recomendações que a campanha outubro rosa já faz muito bem, meu pedido hoje é: busque ajuda profissional, você, mulher, e também, vocês, familiares, para que possam oferecer adequado apoio e suportarem, juntos, o sofrimento que não está nos livros, nem na TV, mas muito fortemente dentro de vocês.