Adhemar Pereira de Barros (Piracicaba 1901, Paris, 1969) foi aviador, médico, empresário e influente político brasileiro entre 1930 e 1960.
VIDA
De família tradicional cafeicultora de São Manuel, interior de SP, foi prefeito da cidade de SP (1957–1961), interventor federal (1938–1941) e duas vezes governador (1947–1951 e 1963–1966). Seus seguidores, ainda hoje existentes, são "ademaristas". Concorreu à presidência da república do Brasil em 1955 e em 1960, conquistando, nas duas eleições, o terceiro lugar. Nas eleições de 1960 visitou o sul de SC; Criciúma e Urussanga. Nesta última cidade acompanhei seus movimentos, eu estava apenas a um ano em Criciúma. Num grande comício no centro de Urussanga foi desafiado pelos populares presentes a consumir leite, uva e melancia simultaneamente, pois havia o conceito que a mistura destes alimentos poderia até causar a morte. Pois não é que o corpulento Adhemar, diante da população local consumiu tudo isso e mais um pouco, sem ser minimamente afetado!
Grande parte da população de Criciúma deslocou-se para Urussanga e assistir ao comício. Lembro ainda de PAULO CARNEIRO e família e de LEANDRO MARTINHHAGO, mulher e filhos, do dentista ALEXANDRE HERCULANO DE FREITAS e outros, rumando céleres para a modesta Urussanga de então e assim conhecer a celebridade.
OBRAS E ALGUMAS HOMENAGENS
Os bairros Cidade Ademar e Jardim Adhemar de Barros; a rua Governador Adhemar Pereira de Barros (em Itapetininga - SP); a avenida Adhemar de Barros (Salvador - BA); a Escola Municipal de Ensino Fundamental Prefeito Adhemar de Barros (bairro Campo Limpo; o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP; o Aeroporto Estadual Adhemar de Barros (Presidente Prudente), o Estádio Adhemar de Barros (Araçatuba); a avenida Adhemar de Barros (Guarujá/SP) e a Rodovia Adhemar de Barros foram nomeados em sua homenagem.
Formação acadêmica e a Revolução de 1932
Formou-se em Medicina em 1923 pela Escola Nacional de Medicina, (atualmente pertencente à Universidade Federal do RJ). Especializou-se no Instituto Oswaldo Cruz. Estudou nos EUA e fez residência médica em várias cidades europeias, onde se tornou aviador, retornando ao Brasil em 1926. Poliglota, Adhemar era fluente em alemão, francês, inglês e espanhol.
Em 6.04.1927 casou-se com Leonor Mendes de Barros, tendo o casal quatro filhos: Maria Helena Pereira de Barros Saad, Ademar de Barros Filho (o Ademarzinho), Maria Pereira de Barros (a Mariazinha) e Antônio Pereira de Barros.
Clinicou até 1932, ano em que se engajou nas fileiras da Revolução Constitucionalista de 1932, como o fizeram, também, grande parte dos jovens paulistas da época. Com a derrota do movimento constitucionalista, exilou-se no Paraguai, onde se alistou como médico na Guerra do Chaco, e na Argentina. Nos seus governos sempre procurou beneficiar os ex-combatentes de 1932 com pensões e homenagens, tendo, em 1947, iniciado a construção do Monumento do Soldado Constitucionalista, em SP.
Guilherme Figueiredo, filho do Coronel Euclides Figueiredo, que atuou no comando do Exército Constitucionalista, afirmou em entrevista de 1977, que Adhemar de Barros já era próximo de Getúlio Vargas e de Filinto Muller desde aquela época e também atuava como agente e informante do governo federal. Ele cita, como prova, carta do Coronel Benjamin Ribeiro da Costa, de dezembro de 1932, quando este estava no exílio argentinio junto aos demais líderes do levante, incluindo o Coronel Figueiredo. O conteúdo da carta era a respeito de informações coletadas por Ribeiro da Costa para elaboração de plano para novo levante contra o regime Vargas. Adhemar de Barros, na qualidade de mensageiro único, teria sido o responsável pela entrega de uma cópia dessa correspondência à polícia de Vargas. O fato foi revelado anos depois pelo jornalista e historiador Hélio Silva, autor de 1932: a guerra paulista, que pesquisava para o seu livro, descobrindo a carta nos arquivos de Vargas.
Vida pública
Primeiros passos
Lançado na política partidária por um tio, ex-senador estadual na República Velha, José Augusto Pereira de Resende, chefe político do Partido Republicano Paulista (PRP) da região de Botucatu. Em 1934 elegeu-se deputado estadual constituinte pelo PRP, fazendo forte oposição ao governador Armando de Sales Oliveira, denunciando principalmente desmandos na administração do Instituto Butantã na gestão daquele governador.
Como deputado estadual defendeu a cultura do café, apoiou o candidato José Américo de Almeida, que disputava contra Armando de Sales Oliveira, a presidência da república nas eleições que deveriam ocorrer em janeiro de 1938. Defendeu presos políticos, entre eles Caio Prado Júnior, e foi oposição ao governo federal de Getúlio Vargas.
Foi deputado estadual até 10.11.1937, quando Getúlio deu golpe do Estado Novo cerrando todas as casas legislativas do Brasil.
Interventor federal (1938–1941)
Durante o Estado Novo foi nomeado interventor federal em SP pelo presidente Getúlio Vargas, recomendado por Benedito Valadares e Filinto Müller. Governou SP, como interventor, de 27.4.1938 a 4.6.1941.
Getúlio, em 1950, assim narrou, para Revista do Globo, a escolha de Ademar:
“A escolha de Adhemar de Barros para a interventoria em SP foi uma prova de meu esforço de dar ao Brasil novos líderes. Adhemar fora me apresentado não me recordo por quem (Benedito Valadares) e passara a visitar-me frequentemente em palácio, trazendo notícias de SP. Ora vinha com novidade sobre a política ora com detalhes sobre o progresso da indústria no estado bandeirante. Com o tempo as visitas se tornaram mais repetidas de sorte que eu ficava ao par de tudo o que acontecia em SP … (Em São Lourenço), convidei-o apenas para interventor e tracei-lhe as diretrizes que deveria tomar. Não o conhecia muito bem e, era necessário, portanto, fazer-lhe algumas observações. (O repórter pergunta se Adhemar foi indicado por alguém): "Não, Mas suspeito que ele era protegido de Filinto (Müller)!".
Inaugurou, no seu primeiro governo, visitas frequentes às pequenas cidades do interior do estado, antes ignoradas pelos governadores. Foram 58 cidades do interior visitadas por Adhemar, somente nos dois primeiros anos da interventoria. Visitou, em 1939, no extremo oeste do estado, em Andradina, o Rei do Gado, Antônio Joaquim de Moura Andrade.
Como interventor, cabia a Adhemar, nomear todos os prefeitos do estado, através do "Departamento das Municipalidades" que prestava assessoria às prefeituras. Adhemar preferiu nomear jovens técnicos para as prefeituras, demitindo todos os prefeitos do estado, logo que assumiu o governo, renovando o quadro político de SP e preterindo políticos do antigo PRP.
Iniciou, em 1939, a construção do Edifício Altino Arantes, sede do Banco do Estado de SP, inaugurado por Adhemar (1949), no seu segundo governo. Iniciou a construção do atual edifício-sede da Secretaria da Fazenda de SP.
Criou e organizou em 5.12.1938, a Casa de Detenção de SP, extinguindo a Cadeia Pública e o Presídio Político da Capital. Este decreto previa a separação de réus primários dos presos reincidentes e a separação dos presos pela natureza do delito. Iniciou em 1940 a construção das atuais dependências da Academia de Polícia Militar do Barro Branco.
Iniciou, em 1939, as obras da Rodovia Anchieta, a primeira rodovia brasileira com túneis. Iniciou as obras da Rodovia Anhanguera em 1940. Ambas as rodovias seriam duplicadas no seu primeiro mandato como governador (1947–1951). Ampliou o Aeroporto de Congonhas. Iniciou a retificação do Rio Tietê. Iniciou a construção do Hospital das Clínicas da USP e do Hospital e Maternidade Leonor Mendes de Barros. Construiu no complexo do Hospital do Mandaqui, hospital para portadores do pênfigo foliáceo, (fogo selvagem), doença que não recebia, na época, nenhuma assistência.
Para dar impulso às grandes rodovias, reformou o DER, Departamento de Estradas de Rodagem, criando nele, setor especializado em grandes empreendimentos rodoviários, por decreto estadual de 30.5.1939, a "Comissão Especial para Construção de Estradas de Rodagem de Alta Classe". No mesmo ano, instituiu ainda a Diretoria de Esportes do Estado de SP, por meio do decreto, nomeando como seu primeiro diretor o então capitão Sylvio de Magalhães Padilha, atleta olímpico brasileiro, quinto colocado nos Jogos Olímpicos de Berlim,1936.
As escolas estaduais, mesmo as rurais, recebiam, no tempo da interventoria, material escolar para as crianças.
Iniciou a eletrificação da Estrada de Ferro Sorocabana e terminou a Estação Júlio Prestes daquela ferrovia. Iniciou o prolongamento da Estrada de Ferro Araraquara, de Mirassol a Santa Fé do Sul, fator decisivo para o povoamento daquela região, a Alta Araraquarense, na década de 1940. O plano de Adhemar era estender a Araraquarense até Cuiabá.
Construiu o Estádio do Pacaembu, em parceria com o então prefeito de SP Prestes Maia, para ser utilizado na Copa do Mundo de 1942, a qual acabou não acontecendo pela Segunda Guerra Mundial. Também, em parceria com Prestes Maia, realizou o Plano de Avenidas de SP, inaugurando, em 1938, com presença de Getúlio Vargas, o túnel da Avenida 9 de Julho.
Construiu e entregou o primeiro autódromo brasileiro, Interlagos. Organizou o Instituto de Previdência do Estado de SP.
Em 1940, confiscou o jornal O Estado de SP, pertencente à família Mesquita e ao seu desafeto político Armando de Salles Oliveira. O jornal só foi devolvido aos seus proprietários em 1945.
Acusado de corrupção foi exonerado do cargo de interventor federal pelo presidente Getúlio Vargas (1941), mas, provou sua inocência no Tribunal de Contas do Estado de SP em 1946.
1945–1951: o PSP e o primeiro mandato como governador
Em 1945 foi permitida novamente a existência de partidos políticos, os quais haviam sido extintos em 1937. Adhemar se filiou à UDN e apoiou o brigadeiro Eduardo Gomes para presidente da república nas eleições de 2.12.1945.
Adhemar logo se afastaria da UDN, fundando em 1946 o Partido Republicano Progressista (PRP), que se fundiu com o Partido Popular Sindicalista (Miguel Reale e José Adriano Marrey Júnior) e o Partido Agrário Nacional ( Mário Rolim Teles), formando o Partido Social Progressista (PSP), que se tornou o maior partido político de SP entre 1947 a 1965, e o único partido político com diretórios em todos os municípios do estado de SP.
Com o retorno de Armando Sales de Oliveira, do exílio, em 1945, Ademar tentou se reconciliar com ele, porém não conseguiu pela recusa da família de Armando Sales.
Eleito governador em 1947, governou SP até 31.1.1951. A Coligação PSP-PCB de Ademar causou protestos entre os membros da Igreja Católica paulista.
Neste período tiveram continuidade importantes obras iniciadas em sua época de interventor, como a construção da segunda pista da Rodovia Anhanguera e a segunda pista da Rodovia Anchieta, ambas pavimentadas e que se tornaram as duas primeiras rodovias brasileiras de pista dupla. As rodovias Anhanguera e Anchieta foram as primeiras rodovias brasileiras com duas faixas de rolamento de cada lado. Adhemar seguiu uma tradição de antigos governantes paulistas, como Washington Luís, que dizia que "governar é abrir estradas".
A pavimentação de estradas, com asfalto e concreto, uma inovação na época, feita por Adhemar, era malvista e criticada por muitos políticos, que a consideravam processo muito caro. Muitos políticos da época entendiam que os recursos públicos estariam melhor empregados se fossem usados na construção de novas estradas de terra e na manutenção e conservação das estradas de terra já existentes.
Seu lema era "São Paulo não pode parar", tempos depois reiterado por Paulo Maluf. Este lema tornou-se ideal da maioria dos políticos de SP.
Neste seu segundo governo estadual, o prefeito da capital paulista era de livre nomeação do governador do estado, o que fez com que Adhemar controlasse também a prefeitura de SP. Em 1947, Adhemar nomeou para a prefeitura de SP, Paulo Lauro, primeiro negro a ocupar o cargo de prefeito da capital paulista.
Criou o Plano Hidrelétrico de SP, base da atual infraestrutura energética do estado e plano convertido em lei (1955). Criou o Ceasa, Centrais de Abastecimento de SP, para distribuição de alimentos no atacado, administrado atualmente pelaCompanhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de SP (CEAGESP).
Criou, depois de violenta greve nos transportes na capital, a Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC), empresa estatal de linhas de ônibus urbanos, 1947. Inaugurou o Museu de Arte de SP (MASP) em 1948. Instalou em 1949, na capital paulista, a primeira linha de trólebus do Brasil e inaugurou, em 1951, a rodovia Presidente Dutra, na época chamada de BR-2, rodovia duplicada apenas em pequeno trecho de SP até Guarulhos, obra iniciada por Adhemar em 1947.
Criciúma não tem seu buraco do prefeito? Pois durante sua gestão foi construída passagem de nível no Vale do Anhangabaú, sob a Avenida São João, que ganhou o apelido popular de "Buraco do Adhemar".
Investindo muito em sanatórios, Ademar torna Campos do Jordão centro nacional de tratamento da tuberculose. A primeira-dama Leonor Mendes de Barros criou em Campos do Jordão (1947), o Hospital "Bandeira Paulista contra a Tuberculose". Sanatórios eram importantes naquela época porque não havia ainda a vacina BCG contra a tuberculose.
Ao assumir o governo, Ademar encontrou deficientes mentais misturados aos presos nas cadeias de SP, e os transferiu para hospitais psiquiátricos. Somente no início de 1947, foram transferidos 947 doentes. Criou a FEBEM, Fundação para o Bem-Estar do Menor, e a Campanha do Agasalho e o "Natal das crianças pobres".
Também enviava, junto com a primeira-dama paulista, Dona Leonor Mendes de Barros, cartas, agasalhos e presentes para pacientes dos sanatórios que construiu.
Em 1947, Ademar terminou o balneário de águas terapêuticas de Ibirá, cujas obras, iniciadas por particulares, estavam paralisadas. Foram desapropriados imóveis e executados projetos para a construção da cidade universitária da USP. Através de lei estadual levou a USP para o interior do estado. criando, entre outras, a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, e a Escola de Engenharia de São Carlos, (por intermédio do deputado federal Miguel Petrilli, cuja base eleitoral era São Carlos), dando origem ao Pólo Tecnológico de São Carlos.
Oficializou o Palácio do Horto Florestal de SP como residência de verão do governador do estado. Criou, em 1948, o salário-família para o funcionalismo público estadual. Iniciou a construção do Aeroporto de Viracopos, terminado no seu segundo mandato como governador.
Criou, em 10.1.1948, a Polícia Rodoviária do Estado de SP, por decreto estadual. Composta inicialmente por 60 ex-pracinhas da Força Expedicionária Brasileira (FEB), a Polícia Rodoviária de SP foi popularizada, na década de 1960, pelo programa Vigilante Rodoviário da TV Tupi.
Criou, em 14.12.1949, por decreto estadual, a primeira Polícia Ambiental da América do Sul. Criou, em 16.8.1950, por Boletim Geral, a Delegacia da Polícia Militar, atual Corregedoria de Polícia Militar do Estado de SP.
ACUSAÇÕES DE CORRUPÇÃO
Talvez as acusações mais conhecidas tenham sido o sumiço das urnas marajoaras, uma bobagem.
Também acusado de corrupção na Estrada de Ferro Sorocabana e em obras viárias, por deputados estaduais, entre eles Caio Prado Júnior, do PCB, fez sua defesa, na Assembleia Legislativa de SP.
Em 1950, Adhemar não se candidatou à presidência, apoiando como governador, ao candidato Getúlio Vargas, constituindo uma aliança entre PTB e PSP que nomearia de "Frente Populista". O apoio de Ademar foi decisivo para a eleição direta de Getúlio à Presidência da República em outubro daquele ano. Getúlio teve, em SP 25% do total de seus votos. Adhemar esperava que, em contrapartida, Getúlio o apoiasse nas eleições presidenciais de 1955.
Outro motivo de Ademar não se candidatar à presidência, em 1950, era que teria que deixar o governo de SP com seu vice-governador e adversário político Luís Gonzaga Novelli Júnior, genro do presidente Eurico Dutra.
Adhemar elegeu como seu sucessor, em 1950, o engenheiro Lucas Nogueira Garcez, que governou SP de 1951 a 1955. Durante seu governo, Lucas Garcez rompeu politicamente com Ademar, não o apoiando na sua tentativa de voltar ao governo de SP, nas eleições de 1954, vencidas por Jânio Quadros. (Continua e finaliza na próxima semana).