Foi em 17.6.1959, no estádio Santiago Bernabeu, Madrid, diante de 70.000 pessoas, jogo amistoso arbitrado pelo holandes Leo Horn. No Santos jogava Pelé, jovem campeão do mundo (1958) aos 19 anos incompletos e o time espanhol, verdadeira legião estrangeira, tinha o veterano craque argentino Alfredo Di Stefano, 32 anos, em final de carreira.
1959 foi o ano de minha formatura na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Paraná. Graduado em dezembro, aproveitei as férias de julho para vir a Criciúma e conhecer a cidade onde iria trabalhar e onde resido até os dias de hoje. No dia 31.7.1959, no consultório do Dr. David Raskin, Hospital São José de Criciúma (ele atualmente reside em POA), atendi ao Dr. Sebastião Toledo dos Santos, nascido em 8.9.1932, Paraisópolis, MG. Engenheiro civil, foi sócio em Criciúma dos empresários João Zanette e Jorge Cechinel. Faleceu súbita e precocemente no aeroporto de Congonhas, SP, aguardando voo para Criciúma, aos 49 anos de idade em 1981.
Em 15.12.1959 houve concorrida reunião em Criciúma, na S.R. Mampituba, centro da cidade, convocada pela FIESC, então presidida pelo Dr. Celso Ramos, futuro governador de SC. Sebastião Toledo dos Santos era presidente da Comissão Permanente do Sindicato dos Mineradores e como tal participou da reunião.
Depois, atendi-o em 27.4.1961, no mesmo consultório, quando David Raskin já transferira residência para POA.
Do primeiro atendimento guardo na memória história que Toledo me contou. Ele, mais um grupo de mineradores da nossa bacia carbonífera, buscavam na Europa adquirir navios para transportar nosso carvão mineral. Seus colegas de viagem ficaram sabendo do jogo Real Madrid x Santos e conseguiram ingressos para todos com imensa dificuldade. Sebastião Toledo dos Santos foi praticamente coagido a ir ao estádio: não gostava e nem sequer havia presenciado jogo de futebol em toda sua vida. Mal se acomodara no assento, entra o Santos em campo. Aplausos aqui e ali. Toledo quer saber:
- Quem é o Pelé?
Alguém informa:
- Camisa branca, número 10 às costas.
Toledo dá-se conta que não via nem o número dez pintado na camisa de Pelé nem o número de qualquer outro jogador. Mal retorna da viagem de negócios procura o consultório de Raskin para submeter-se a exame de olhos.
Pré-jogo
O amistoso ocorreu duas semanas depois do Real Madrid conquistar seu quarto título europeu. O Santos, campeão paulista, excursionava pela Europa tendo vencido 11 de 13 jogos disputados. Nas últimas três partidas, a equipe paulista vencera o Hamburgo, campeão alemão daquele ano por 6x0, o Hanover por 7 a 1 e o Twente por 5 a 0. Arrasador, o Santos acumulava escore agregado de 18 a 1 nos últimos 3 jogos.
A partida com o Real Madrid homenageava Miguel Muñoz, que encerrava sua carreira. A crônica espanhola via a peleja como confronto entre Alfredo Di Stéfano (32 anos), considerado o maior jogador do futebol europeu e o jovem Pelé (18 anos), campeão do mundo na Copa do Mundo FIFA de 1958 na Suécia.
A delegação santista hospedada no antigo hotel Alexandra chegava cercada de expectativas na capital espanhola. O técnico Lula advertiu contra o clima de já ganhou. “Recomendou que tivéssemos cuidado com o ataque do Real Madrid, principalmente com Alfredo Di Stéfano. O time deles era quase perfeito”, relembra Pelé. O Jornal dos Sports, dia anterior ao jogo, chamou-o de “autêntica final de campeonato mundial de clubes".
O JOGO
Logo aos 10 minutos, Pelé acerta forte chute de fora da área, abrindo o marcador. Porém, em 20 minutos o Santos sofreu três gols do atacante Enrique Mateos aproveitando três notáveis assistências de Alfredo Di Stéfano. No segundo tempo, reação brasileira. Pepe marcou, em violenta cobrança de pênalti, sofrido por Pelé. Os donos da casa ampliaram com Ferenc Puskás: mergulho de peixinho testando a bola, dentro da área. Major Puskas, do exército magiar, foi estrela maior da grande seleção húngara de 1954, vice-campeã mundial na Suiça. Mas, Pelé chutou forte, o goleiro espalmou e o rebote ficou com Coutinho, 16 anos recém-completados, que empurrou para as redes: 4x3! Aos 38 minutos, Di Stéfano realiza sua última e quarta assistência. Avança pelo meio e lança passe milimétrico para Gento fechar o placar: 5x3!
PÓS-JOGO
O argentino Luis Carniglia, treinador do Real Madrid, elogiou Pelé: "mostrou grande facilidade de chutar, muita malícia, malandragem. Carrega a bola muito bem e infiltra perigosamente. Mas foi muito bem marcado”. Presidente do clube merengue, Santiago Bernabéu passou pelo hotel Alexandra para visitar a delegação santista; embora encantado com o futebol de Pelé, concluiu que ele ainda era muito jovem! Já para o Marca, o jogo mostrou que Alfredo Di Stéfano era o melhor jogador do mundo. Descreveu o "grande trabalho de Alfredo Di Stéfano, um maestro, capaz de literalmente destruir um rival lento e pretensioso.” Conclusão espanhola: o Santos tinha quatro grandes atacantes (Pepe, Pelé, Pagão e Coutinho), mas uma defesa lenta e fraca. E Pelé era grande promessa, embora muito individualista. Diferente de Alfredo Di Stéfano: “no Santos, o time joga para Pelé. No Madrid, Alfredo Di Stéfano joga para o time”, analisou Agustín Gaínza.