Neste sábado (14), o Movimento Negro de Criciúma vai realizar uma manifestação pacífica em alusão ao 13 de maio, Dia da Abolição da Escravatura. A data nacional rememora a assinatura da Lei Áurea em 1888 pela Princesa Isabel. Com atrações culturais, exposições, intervenções artísticas, assessoria jurídica e muito mais, o ato acontecerá a partir das 9h na Praça Nereu Ramos, em Criciúma.
Há mais de um mês, Criciúma registrava um caso abominável de racismo. Uma mãe orgulhosa postou foto de sua filha em rede social e, de uma das internautas, recebeu como resposta: "Desculpa aí, mas o que eu vi foi uma macaca se coçando".
O caso de imediato ganhou grande repercussão e, desde então, a família busca por justiça enquanto tenta superar o trauma sofrido. Em solidariedade a esse e outros casos, que não tiveram tanta reprodução, o ato público é um manifesto exigindo justiça. Três grupos antirracismo de Criciúma estão envolvidos: Coletivo Chega de Racismo, Entidade Negra Bastiana (ENEB) e Anarquistas Contra o Racismo (ACR).
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“Aproveitaremos o sábado para irmos num local público com circulação de pessoas, para dar visibilidade ao caso e dialogando com a população sobre alguns casos que ocorreram em Criciúma nos últimos tempos. Vai ter relação com o da menina, mas vamos colocar outros que também aconteceram mas não tiveram a mesma repercussão”, explicou o coordenador do Coletivo Chega de Racismo, Alex Sander da Silva.
Caso de Criciúma
Logo após o ocorrido, a família recebeu total apoio dos três movimentos. Segundo Alex, eles estão se sentindo acolhidos pelo Coletivo. “Tiveram uma conversa com uma psicóloga para tratar do trauma. Foi algo inesperado e causou um impacto em suas vidas. Medo, ansiedade e revolta foram os sentimentos relatados por eles”, contou.
Mesmo frequentando um psicólogo, o pai, Fabrício Silvério Lucas, relatou muita dificuldade em lidar com a situação e, principalmente, tentar se manter forte diante da filha.
“Hoje, eu tento passar para as pessoas que eu estou bem, mas no fim eu não estou bem. Está sendo um momento muito difícil, cada dia que passa, a gente pensa que vai esquecer, mas tá sendo o contrário, quanto mais tentamos viver, mais vem lembranças, principalmente na minha mente e da minha filha”, desabafou o pai.
Dores da menina
Apesar de ser uma criança, a menina entende e sente as dores do racismo. Fabrício disse que ele e a esposa, Thaise, tentam passar transparência para a filha, ensinando o que é certo e o que é errado, mas sentem a ausência dela dentro de casa.
“Acontece várias vezes de a gente estar em casa conversando, eu e a Thaise, quando vamos ver, ela (filha) está no quarto chorando. A gente questiona por que ela está chorando e ela fala que é por que a moça chamou ela de macaca… É muito difícil para mim, como pai, ter que olhar para o rosto da minha filha e falar para ela que ela não é macaca”, contou emocionado.
Traumatizados e tentando buscar uma forma de superar o fato, a família recorreu a ajuda psicológica. “A gente está fazendo tratamento com psicólogo, mas cada dia está sendo mais difícil para a gente. Mesmo fazendo tratamento. A gente tenta superar, mas parece que aquela dor, aquela fisgada no coração, o peito machucado, eu mesmo estou praticamento todo destruído, mas é levantar a cabeça e agarrar em Deus”, disse.
Coletivo Chega de Racismo
O Coletivo Chega de Racismo existe desde 2014, e acompanha os casos de racismos que acontecem em Criciúma e região, busca dar suporte e orientação para as vítimas, acompanha os processos judiciais e dá palestras nas escolas sobre o tema.
O grupo mantém um canal de divulgação de atividades e eventos sobre o tema nas redes sociais. Há uma coordenação com sete membros organizados e um grupo aberto no WhatsApp com simpatizantes da causa, em torno de 100 pessoas.
Busca por justiça
Depois da repercussão negativa do caso nas redes sociais, a mulher acusada de dizer “desculpa aí, mas vi uma macaca se coçando”, se apresentou à Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI) de Criciúma. O caso corre em segredo de justiça por se tratar de uma criança.
“Eles [família da vítima], estão sendo acompanhados por uma advogada, inclusive, que faz parte do Coletivo Chega de Racismo, e depois do processo-crime, em paralelo, ela vai entrar com uma ação civil sobre danos morais, questão voltada mais para a parte civil”, comentou Alex.
Segundo ele, os familiares estão dando muito suporte e incentivo para que Fabrício e Thaise sigam em frente com o caso. “Teve só uma pessoa da família que demonstrou preocupação e meio que foi contra às questões que eles encaminharam, por exemplo, acionar a Justiça sobre o caso, mas é só uma pessoa, nos demais há um apoio, para que seja, de fato, feito Justiça, no sentido bom do termo”, disse.
Para o pai, a importância da repercussão do caso é que sirva de exemplo para outras pessoas, que a sociedade se manifeste e não fique calada. “Mesmo sofrendo racismo, a gente tem que se manifestar, temos que nos posicionar, a guerra não acabou, a batalha não acabou, e eu vou em frente pela minha filha, por mim, pelo caráter da minha filha. E que a justiça seja feita!”.