Jorge Boeira, empresário e ex-deputado federal
George Floyd era um homem negro de meia idade que foi barbaramente assassinado por um policial branco em Minneapolis (Minnesota/USA). O fato está levando milhares de pessoas às ruas de várias cidades daquele país para protestar contra a forma brutal que resultou naquela morte, mas não apenas contra a morte em si, também, para denunciar o racismo estrutural que ainda vigora naquele país que se arvora a se apresentar perante ao mundo como a maior democracia do ocidental.
A tragédia serve-nos para refletir não apenas sobre o que está ocorrendo nos Estados Unidos, mas, principalmente, como se processa, aqui no Brasil, a questão do racismo. Lá, trata-se de uma questão estruturada declarada pelos supremacistas brancos. Aqui, de forma institucional praticado pelo Estado e naturalizado ou velado pela sociedade comprovando que o marco legal existente, em especial o Estatuto da Igualdade Racial, por si só não é suficiente para dar voz e vez aos afrodescendente que aqui vivem, pois o racismo enquanto uma hedionda e perversa chaga social ainda se manifesta muito fortemente pela desigualdade social existente no Brasil que aqui se manifesta em toda a sua plenitude em função da cor da pele e que persiste desde das menores às maiores atitudes cotidianas, desumanizando gentes, coisificando pessoas, banalizando vidas buscando torná-los invisíveis perante ao Estado e à sociedade .
Mas, os negros e negras existem. O racismo institucional, o naturalizado/velado não é um conceito abstrato. Ao contrário, ele se estrutura materialmente num conjunto de ações e políticas do Estado (neste caso falamos do racismo institucionalizado) e na sociedade que fingem não reconhece-lo, apenas concretá-lo, nas diversas formas de desigualdades. Desigualdade social que não se trata de uma fantasia qualquer.
Se perguntarmos a qualquer pessoa se ele é racista, dificilmente encontraremos alguém que o confesse. Se perguntado se de algum modo já ofendeu a coletividade de negros e negras ou se reconhecem as desigualdades sociais no Brasil oriundas da discriminação racial existente, com certeza irão negar. A grande verdade é que as atitudes são subliminares e prestam a escamotear, com precisão, a forma covarde pela qual o racismo se revela no Brasil.
O assassinato de George Floyd serviu para despertar a sociedade americana para uma nova batalha conta o racismo e para refletirmos sobre a forma como o racismo se apresenta entre nós. Silenciar neste momento é concordar com o racismo é atentar contra a democracia, pois não há sociedade plenamente democrática numa sociedade marcada pelas desigualdades e pela falta de oportunidade a todos.
I can’t breath! A frase, clamada em desespero para chamar a atenção do policial de que estava morrendo, não foi o bastante para sensibilizar o supremacista branco que aquela vida valia tanto quanto a dele. Deverá, a partir de agora, ser o tema adotado por todos que se aliarem contra toda a forma de racismo, porque ela exprime a angústia, o sofrimento e a possibilidade da morte em função da cor da pele numa sociedade predominante desigual que sufoca, quando não castra, mina e mata sonhos e vidas.
Indiferentemente da forma que o racismo se manifesta, no fundo faz milhares de George Floyd no dia a dia por esse Brasil afora que vivem sofrendo, quando não morrem sob olhares e gestos subliminares que subalternam a dignidade humana e reduzem a frangalhos a cidadania, cassam sonhos, ideais e direitos, minam a vida e desoportunizam projetos.
Vidas negras importam tanto quanto como todas as outras vidas importam. Logo os negros e negras são merecedores de se situarem no mesmo patamar hierárquico dos brancos em se tratando de convivência e condição social. O racismo, jamais pode servir como instrumento de atitudes segregacionistas e de dominação ou exploração por grupos sociais, instituições ou pessoas que julgam que a cor da pele pode ser fator de superioridade em se tratando da raça humana. O racismo é a mais vergonhosa forma de incivilidade humana e foi ele que levou à morte George Floyd.
“I can’t breath”, tal como ele, também a nós, se não tomarmos medidas urgentes, não podemos respirar.
Não podemos respirar até o dia em que ninguém mais será discriminado em função de sua pele e que os negros não mais serão vistos de soslaios ou olhares desconfiados;
Não podemos respirar até o dia em todos se sentirão irmanados num mesmo coração, sentirão as mesmas emoções e compartilharão as mesmas oportunidades;
Não podemos respirar até o dia em que todos se unirão em prol de uma convivência harmoniosa e até que ninguém mais seja angustiado ou desumanizado pela discriminação racial;
Não podemos respirar até o dia em que todos os racistas se resignarão e se sentirão como imagem e semelhança de seus irmãos negros e todos eles poderão respirar os ares da liberdade e da igualdade;
Não podemos respirar até o dia em que se construirá uma consciência universal, que se transformará em um princípio imperativo, dotado de certeza e garantia absoluta de que, jamais, nenhum joelho será posto sobre pescoços.
Isto posto, poderemos voltar a respirar.