Thiago Ávila *
Fãs de Nascar são loucos. Pelo menos dez áreas enormes de camping todas lotadas de trailers, com bandeiras dos Estados Unidos hasteadas por todo canto, junto, claro, com alguma bandeira de torcida para algum piloto. Piscina, churrasqueira, caixa de som, violão, taco de beisebol, bola de futebol americano, tudo o que se possa imaginar os malucos da Nascar levavam. E o mais engraçado nisso tudo é que eles ficavam no acampamento, apenas.
O final de semana da Nascar na cidade de Loudon, em New Hampshire, são três dias de intenso movimento de pessoas, mas quase nada nas arquibancadas. Chegando na sexta-feira, a impressão era de casa cheia, mesmo sendo um dia apenas de treinos para os carros na pista, já que havia muitos carros e muitos visitantes. Mas tudo passava de ilusão. As arquibancadas estavam vazias, tinha menos de 200 pessoas assistindo à classificação numa capacidade máxima para 105 mil pessoas. Mas e o resto dos torcedores? Ao lado de seus trailers sob um absurdo sol de 37°C, tomando uma cervejinha, um banho de piscina, batendo um papo com outros campistas, arranjando um espaço para jogar um football... enfim, em qualquer lugar, menos vendo carros na pista.
Na verdade, eles viram carros na pista. Só que à noite, e não era bem essa pista que você conhece... Às 19 horas, num lugar um pouco isolado do oval tradicional, havia um ambiente meio peculiar, numa estrada de terra, cercado por motor homes – óbvio – um som alto de música country, muita cerveja, e num espaço cercado por grades, uma pequena pista oval de terra, com arquibancadas lotadas em volta, fora as centenas de pessoas em pé ou sentadas em cadeiras de praia. Na pista, carros antigos dos mais variados possíveis – até fusca. Eram os chamados Dirt Duels (duelos sujos, traduzindo).
Além do mais, o torcedor norte-americano não está interessado na velha e boa corrida justa, ele quer entretenimento, disputas o tempo todo, batidas, rodadas, areia voando. A cada enrosco a galera ia a loucura. Se uma corrida estava entediante demais, vaiavam. Às vezes até achavam um motivo bobo para chamar o Safety Car e reaquecer a corrida.
O autódromo inteiro de New Hampshire tem em torno de 4,5 Km2, 450 hectares de extensão, contando as dezenas de estacionamentos, mais as áreas de camping e as duas pistas.
Para chegar até a entrada das arquibancadas era necessário um transporte que circulava entre os estacionamentos. No sábado, o público era maior, já haviam umas quatro áreas de parque lotadas, com isso, os transportes também demoravam mais para chegar. Mas por incrível que pareça, as arquibancadas continuavam quase vazias, agora visivelmente com pelo menos duas mil pessoas, mas nada perto da capacidade ideal.
Nesse dia, três corridas foram realizadas, de categorias inferiores, e o máximo de pessoas que dava para perceber não chegava a 10% da capacidade total, isso na corrida da Xfinity, a segunda categoria mais popular da Nascar. Toda aquela gente que lotou diversos estacionamentos simplesmente não assistiu nenhuma corrida. Estavam ali puramente para passar o final de semana acampado com a família e os amigos como se estivessem numa praia. Esse é o hobby do americano médio.
Durante os passeios pelo transporte era uma sessão de sociabilidade. Ninguém se conhecia, mas puxavam papo sobre qualquer coisa. Tinha uns que davam mais de duas voltas completas no carrinho só para continuar conversando com as pessoas, ou às vezes porque tinha passado direto da parada desejada sem nem perceber.
Um caso curioso foi que em uma dessas paradas, um homem que devia ter seus 30 anos, de óculos escuros, calça, chinelo e usando uma bandana, apareceu com um violão e falou para as pessoas no carrinho: “Eu vou cantar uma música que eu escrevi para minha namorada”. Ele começa a tocar e dez segundos depois o carro se vai, e ele, mesmo perdendo a platéia, continua cantando.
Enfim chegou domingo, no dia da corrida principal. Agora praticamente todos os estacionamentos e áreas de camping já estavam lotadas há três horas antes da corrida. E finalmente os campistas saíram de seus trailers e visitaram as arquibancadas. Aproximadamente 85 mil pessoas acompanharam a prova sob um calor de 34°C, sem áreas cobertas. Protetor solar era o mínimo.
Aí começava a ver a paixão que os americanos tinham pelo esporte e pela nação. A começar pela empolgação no hino nacional. Uma moça cantando à capela, juntamente com milhares de pessoas nas arquibancadas e na pista. Os jatos do exército passavam e eles acenavam. Praticamente todos os pilotos tinham uma torcida, e o mais engraçado é que os caras torciam mesmo, vibravam a cada ultrapassagem como se fosse um gol, e vaiavam quando alguém que fosse ‘rival’ cruzava a linha de chegada.
O mais odiado era Kyle Busch. Isso porque Buschinho é um dos melhores pilotos da categoria, tem um ótimo carro e acaba vencendo na maioria das vezes. O público da Nascar odeia hegemonias. Quando o piloto bateu no muro em uma das voltas, a torcida foi à loucura! Em contrapartida, Kevin Harvick era o mais amado pela galera. Ele liderava nas últimas voltas e teve uma disputa intensa com Danny Hamlin. A cada volta cruzada em primeiro, o público se levantava e fazia uma espécie de ‘ola’.
No fim, deu o resultado que o povo queria, Harvick venceu e deu uma volta segurando a bandeira quadriculada, e Buschinho foi só o oitavo, mesmo tendo liderado a maioria das voltas.
Esse foi o final de semana da Nascar em New Hampshire. Uma experiência extremamente diferente de qualquer evento automotivo de peso no Brasil. Sem falar das estradas muito bem planejadas para o evento tanto na ida quanto na saída. Fãs despreocupados, que curtiam o evento com a ótima organização e estrutura que a competição e o autódromo forneciam.
Pois é. Fãs da Nascar são loucos.
* Estudante de Jornalismo da PUCRS