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* as opiniões expressas neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do 4oito
Por Aderbal Machado 07/10/2023 - 08:00 Atualizado em 07/10/2023 - 09:31

Relembro alguns colegas lá dos tempos d’antanho – meu tempo de primícias – quando o esforço maior consistia em falar mais difícil, pra mostrar, em tese, inteligência, conhecimento, vocabulário rico. Na verdade, o hábito era redigir com um dicionário ao lado, buscando sinônimos para termos corriqueiros e, assim, “enfeitar” a escrita ou a narração.

Assim, médico virava “esculápio”, hospital era “nosocômio”, advogado era “rábula” ou “causídico”, tempo antigo era “priscas eras”, todo esforço maior era “hercúleo”, jogo encerrado era jogo com” cifras definitivas do marcador”, a prefeitura era “paço” (ainda usam hoje muito), algo mais notório era “conspícuo”, jornal semanário era “hebdomadário”, coqueluxe era “tosse comprida”, vermífugo era “remédio pras bichas” e o cara não muito urbanizado era “mandurico” (muito típica do Araranguá, meu torrão). 

Há mais. Desafio à criatividade os meus seis leitores. Enfileirem outros e brinquem com a casualidade do momento.

Pois vejam a evolução. Amestrado profissionalmente por César, Aryovaldo e Agilmar, os jornalistas pioneiros da família, introduzi no meu estilo a realidade incontrastável: escrever bem é escrever simples, com objetividade, sem meneios e escapismos. E sem arrogâncias vernaculares. Enfim, sem contorcionismos. Ou sem “floreios”.

Porque, em verdade vos digo, escrever bem não é seguir regras conceituais de uma redação técnica. Escrever bem é fazer-se entender com clareza. De preferência, com atração de conteúdo. Enfim, bater na moleira. Leu, entendeu. E, tanto quanto possível, gostou.

Hoje a temática é esta. Estou divagando porque, na essência desses dias, com chuva vertendo por todas as cumeeiras e escorrendo por todas as coxilhas (minha veia gauchesca pretensiosa gritando por aqui), a visão de muitas terras é de susto e tristeza. 

Valha-nos o Grande Arquiteto do Universo no amparo aos necessitados.

Por Aderbal Machado 30/09/2023 - 09:24 Atualizado em 30/09/2023 - 09:25

Ficamos imaginando sempre qual o sentido da vida. 

De repente, referências da vida da gente vão indo embora, numa sucessão danada de ruim e num espaço de um ano. Só um ano. 

Primeiro se foi minha cunhada Beti, irmã de Sônia, parceira de tantas empreitadas da vida, desde quando, no limiar da vida, a gente começou a se relacionar – eu e Sônia - e ela sempre como nossa sombra cúmplice. Nossa comadre. A ela devemos as conversas longas em tertúlias regadas a jogatinas divertidas, presenças memoráveis em festas e recreações, as brincadeiras nos aniversários. Isso é insubstituível. Never more. Soa mal, mas é: nunca mais. 

Depois, o Aimberê, mano velho de guerra, resolveu partir também. Ele esteve comigo nos primeiros momentos da infância e nos muitos momentos da juventude, permanecendo firme ao longo da vida, algumas vezes mais longe, outras tantas vezes mais perto. Porém, sempre ali. Divergíamos ideologicamente, politicamente e às vezes até em relação a coisas menores, sem importância vital. Ficávamos horas jogando palavras ao vento. Convergíamos, no entanto, em literatura, fraternidade cheia de viço sempre, risadas infinitas por tudo ou por nada. 

Agora se vai Zezinha, minha cunhada, casada com meu mano mais velho – Zélia Zita do Canto Machado. Filha de Ramiro e Mariquinha do Araranguá, sempre terna e solidária -, após ultrapassar a barreira dos 90 anos. Viveu felicidades múltiplas ao lado do meu mano César, com quem se uniu ainda na puberdade (ele com 16 e ela com 17 anos). Viveram todas as agruras possíveis e imagináveis da vida lutada. Foram bravos. Esmagaram as pedras do caminho, constituíram uma bela família e, afinal, chegaram ao mérito de uma vida profícua, semeada de conquistas. A família de Zezinha, numa misturança de personalidades cativantes, desde as irmãs, os irmãos, os filhos e os netos, assinalou uma época de indiscutível valor nas nossas vidas. Desde as benzeduras contra cobreiro de Dona Mariquinha, até as noites indormidas de Otávio Ramiro nas mesas de baralho do Fronteira Clube, sob apostas pesadas. Em compensação, as comemorações de finais de semana da família eram sagradas para Otávio Ramiro. E ai do genro, filho ou filha que não comparecesse. E as recepções na sua casa da praia do Arroio do Silva dos velhos tempos, cercada de dunas, construção de madeira sobre estacas (ou, diria hoje, pilotis). Cheia de quartos e uma cozinha fartíssima. Alimentaria um exército.

E fico pensando nos momentos vividos com elas e ele - tantos foram -, cheios de sabores e alegrias. As histórias e estórias, os entreveros sociais, os lazeres, as andanças, até as recriminações, os enaltecimentos, os primores e os humores, as manias e os enchimentos de vida a cada detalhe, a cada olhar, a cada passo.

Às vezes, por essas situações, penso ser complicado viver sem referências. Pois ficamos ocos, vazios, estremecidos, perdidos. 

Salvamo-nos na lembrança fértil e no olhar ao passado tão belo, tentando remontá-lo pra cá. Deus queira consigamos. Afinal, essas coisas têm suas crueldades e fatores inesperados, mas a vida precisa ser vivida enquanto o último sopro não acontece.

Não choro em público e nem revelo meus choros por saudades disso tudo e desses todos. Porém em silêncio, cá dentro ou externando, sim: eu choro. Só de pensar na irreversibilidade da vida. Dizia mamãe, outra artista da vida: “A única coisa da vida de que não se escapa é da morte”. A velha Amarfilina sabia muito. E por isso foi em paz. Católica fervorosa que era, aduzo, para homenageá-la: na paz do Senhor.

Por Aderbal Machado 23/09/2023 - 07:00

Um tempo de lembranças. Dia desses, referi vereadores de Criciúma, presidentes da Câmara Municipal, com quem tive a honra de conviver e trabalhar. Citei Miguel Medeiros Esmeraldino, Edi Tasca, Eno Steiner, Pedro Guidi, Nereu Guidi e omiti, imperdoavelmente, Wilmar Zozimo Peixoto. Considero imperdoável, primeiro pelo lapso de memória condenável e mais ainda por ter sido ele um dileto amigo por anos e anos, mesmo fora da relação institucional como vereador e eu como jornalista ou assessor da Câmara. Os demais também o foram, mas Wilmar, com aquela carona grande de bonachão eterno, me fazia sentir muito além de mim mesmo. Refaço este registro por méritos absolutos do ilustre personagem da história política de Criciúma.

Refaço, ao mesmo tempo, uma memória da época de Câmara. Ali operavam apenas três pessoas: Aristides Mendes, o Tidinho famoso; Ernalda Naspolini e eu. Tidinho cuidava das atas e da contabilidade da Casa. Ernalda, das correspondências e eu da agenda do presidente, dos pareceres e das pautas das sessões. Simples assim. E, milagre: funcionava sem percalços. Ninguém se esbarrava nos corredores e nem se misturavam funções.

Tidinho bem lá atrás e Ernalda recentemente nos deixaram. Ficou o suprassumo de suas presenças por aqui. Marcos da minha vida criciumense, dentre tantos e infinitos outros.

Pois naquela época a política efervescia como nunca. Apenas havia menos conflitos misturados. Eram muito específicos: resumiam-se quase só à relação Executivo/Legislativo e às sucessões da Mesa da Câmara. Neste último caso houve entreveros formidáveis com resultados surpreendentes em várias ocasiões. E deles participei ativamente. Lembro todos aqui dentro do bestunto. Peço vênia para deixar pra lá. São muitos detalhes envolvendo quem já se foi. Não quero pra mim o ônus da covardia de citá-los sem poder ouvi-los.

Houve tantos episódios saudosos, mesmo os mais cabeludos e azedos, contabilizados na minha memória esmaecida...

Enfim, os registros são apenas relicários de um tempo cujo âmago fica pra mim. 

Assim é e assim será. 

Dominus vobiscum.

Por Aderbal Machado 16/09/2023 - 07:00

Uma semana inteirinha, trabalhando e imaginando a temática desta crônica. Sim, nem imaginem a sucessão de tertúlias e sofreguidão mental, tentando encontrar um novo texto. Porque divido as coisas: redigir é ciência, mas escrever é arte. Depende da distribuição dos termos num papel ou num computador cheio de vicissitudes e carências, como o meu.

Redigir, basta conhecer técnicas de começo, meio e fim e as grafias corretas. Conheci pessoas, em Criciúma e tantos outros lugares por onde coloquei meu jeito de ser e fazer, cujos conhecimentos nem era tão profundos e especiais, mas expunham com maravilhosa beleza seus pensamentos. Enfim, escrever é ser agradável à leitura. O resto é o resto. Disso tenho medo e todo escrevedor profissional deveria ter: ser mal digerido em seus escritos.

Mas vamos lá, depois desta peroração indevida, talvez.

São tantas as ocasiões de citação de Fernando Pessoa, na sua frase lapidar: “Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”. Colocam-na em qualquer lugar, perdida às vezes num cipoal de doidices (ah, mas o que seria do mundo sem os loucos...).

Todavia, a frase está num contexto maravilhoso: o seu poema Mar Português. E o trago aqui nem tanto para reafirmar o dito, e sim para deliciar com seu sabor indelével e contexto até histórico dos tempos do desbravar dos mares. Leiam e interpretem:

MAR PORTUGUÊS
Fernando Pessoa

 

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

 

Valeu a pena? TUDO VALE A PENA
SE A ALMA NÃO É PEQUENA.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

As poesias, bom dizer, não são feitas para serem entendidas, lá no fundo, mas sentidas. Bem no fundo, nos recônditos da alma. Sinta aí.

Por Aderbal Machado 09/09/2023 - 07:00

Passa a Semana da Pátria, relembro meus dias de odes à data. Quando estudante, no Araranguá (Grupo Escolar Castro Alves), aguardava ansioso pelo desfile. Adorava aquela formalidade da marcha. Na minha sala, professora Nialva Rodrigues Villanova (recentemente falecida em Florianópolis), repassava nossas instruções e conferia os ensaios da marcha. Ah, sim, um dos membros da fanfarra da escola era Lulu, o rei do tamborim e do bumbo. Campeão. Meu parceiro de futebol, inclusive, no GEA (Grêmio Esportivo Araranguaense). Seu irmão Nadico também jogava. Mas Nadico não estava na escola então. Era entregador do armazém de “secos & molhados” do Luiz Wendhausen, na época localizado no prédio da Bene Chede, esquina da Praça Hercílio Luz com a Beira Rio.

No dia “D”, criavam-se os pelotões especiais. Resolveu dona Nialva me colocar no “Pelotão de Saúde”. Desfilávamos vestidos com uniforme branco, com uma cruz vermelha no boné e na manga da camisa. Jamais entendi a escolha: jamais tive qualquer pendor, conhecimento ou proximidade com a área da saúde. A tiracolo, levávamos uma bolsa de primeiros socorros (se mandassem ou fosse necessário grudar um band-aid em alguém, não saberia).
Mas o inusitado nunca bloqueou a beleza e o sentimento reinante cá dentro. 

Mais tarde, 19 anos, convocado para o Exército (1963-1964), integrei o grupamento da soldadesca do 14º Batalhão de Caçadores (hoje 63º Batalhão de Infantaria de Florianópolis) e, no 7 de setembro de 1963, desfilamos garbosos na Praça XV, prestando continência ao então Governador Celso Ramos, num palanque instalado na entrada da Rua Felipe Schmidt, sobre o Jardim da praça.

Pois saibam: mantive por muito tempo o prazer de assistir a desfiles e sentir o clima. Perdi isso. Tornou-se um lugar comum. Conseguiram chamuscar a festa com vinculações de ordem ideológica e política, como se o Brasil fosse de um dono ou outro, em disputa pela hegemonia da cerimônia. 

Ainda mantenho a chama do patriotismo, mas com certo desânimo, lastimo afirmar. 

Encerro com a genialidade do poeta do patriotismo, Olavo Bilac:

A PÁTRIA
                       
Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste,
criança ! Não verás nenhum país como este!
Olha que céu que mar! Que rios ! Que floresta !
A natureza aqui, perpetuamente em festa,
é um seio de mãe a transbordar carinhos.
 
Vê que vida há no chão ! vê que vida há nos ninhos,
que se balançam no ar, entre os ramos inquietos !
Vê que luz, que calor, que multidão de insetos!
Vê que grande extensão de matas, onde impera,
fecunda e luminosa, a eterna primavera!
Boa terra! Jamais negou a quem trabalha
o pão que mata a fome, o teto que agasalha!
Quem com o seu suor a fecunda e umedece,
vê pago o seu esforço, e é feliz e enriquece!
 
Criança! Não verás país nenhum como este!
Imita, na grandeza, a terra em que nasceste!

Por Aderbal Machado 26/08/2023 - 10:01 Atualizado em 26/08/2023 - 10:02

Nem mais me recordo o nome da revista. Em 1959 ou 1960, o fotógrafo Osmar Zapellini, um mago das imagens, editava uma publicação em cores (uma ousadia para a época!), mostrando muitas imagens da cidade e expondo matérias sobre gentes e coisas. Algo bem social. 

Duas dessas matérias estão vivas na minha memória: uma sobre o Metropol, destacando Chico Preto, numa foto do atleta aplicando uma “bicicleta” à Leônidas – seu “inventor”. Metropol já era uma lenda com Mário Romancini e Dorny, seus goleiros, Sabiá, Pedrinho, Flázio, mais tarde Nilzo, Valdir Paulo Berg, Calita, Rubão (outro goleiro, o mais famoso deles, folclórico), Sílvio, Márcio, Madureira, Edson Madureira (irmão do Madureira, mais novo, depois jogou no Internacional de POA), Vevé e tantos outros.

A outra matéria enfocava a Rádio Eldorado dirigida por Sérgio Luciano (Joci Pereira), como relatou a matéria. Compunham a emissora nomes como o de Antônio Luiz (Antônio Sebastião dos Santos, mais tarde gerente e diretor), Clésio Búrigo, Kátia (Adelaide Delci Broleis), Odery Ramos e outros nomes, que, como no caso de jogadores do Metropol, não lembro. 

A reportagem tinha fotos que me extasiavam e me faziam sonhar com o dia em que pudesse, também, até pelo atavismo inspirador que emanava em mim, vindo dos irmãos radialistas, ser um locutor e merecer este nome.

Em 1961 fui para Criciúma, aos 17 anos, trabalhar – e aprender, mais aprender que trabalhar – com o Aryovaldo, mano mais velho, que já tinha um nome consolidado na cidade. Ele era vereador do PTB (aquele legítimo, o do Getúlio, do Jango e do Doutel, amicíssimo do Aryovaldo) e, como tal, foi nomeado Chefe de Gabinete do prefeito recém-eleito de Criciúma, o jovem advogado Neri Jesuíno da Rosa, do PTB. Virei auxiliar de almoxarife (e, bênção de Deus, tenho a ficha funcional até hoje, lá se vão mais de 60 anos).

E assim começou a saga. O fim, só a vida me ensejará. Não tenho pressa. Ah, sim: a Criciúma de hoje, na comparação com aquela lá de longe, me espanta substancialmente. Parece outra, completamente diferente. Quem viveu a época e ainda está aí hoje me entende.

Por Aderbal Machado 19/08/2023 - 12:00 Atualizado em 19/08/2023 - 12:01

Leio os noticiários da política nacional e argentina, os compartilho, às vezes comento despretensiosamente, mas paro. Longe de mim a intenção, deliberada ou casual, de enlouquecer. O cenário é travesso e pouco diáfano.

Relembro, hoje, aqueles cidadãos a quem servi como assessor na presidência da Câmara de Criciúma, nos idos de 1960/1970: Pedro Guidi, Miguel Medeiros Esmeraldino, Eno Steiner, Edi Tasca, Nereu Guidi.

Enalteço a oportunidade ímpar de ter servido como funcionário da Câmara a pai e filho, Pedro e Nereu. 
Precioso lembrar: Miguel, Eno e Edi, udenistas rachados. Pedro e Nereu, pessedistas de quatro costados. No entanto, essa condição não nos afastou. Pelo contrário, nos uniu. A eles importava o trabalho. Bons tempos dessa prevalência.

As singulares de cada um ficaram marcadas. Uns mais duros na contenda, outros mais liberais. Uns puxavam a corda rápido. Outros afrouxavam pra ver até onde a coisa ia.

Impossível enumerar os vereadores da época de cuja convivência também usufruí. Passei até pelo tempo da vereança gratuita. Mandato sem remuneração. Pelo povo, para o povo e com o povo, diria a gente hoje. O sonho acabou. Todos, no entanto, pragmáticos. 

Houve alguns muito especiais na lembrança, como Romeu Lopes de Carvalho, o “Romeu Penicilina”, por ser servidor do IAPETC (Instituto de Aposentadoria e Pensão dos Empregados em Transportes e Cargas), cuja abrangência pegava os mineiros do carvão. A reforma mudou tudo, para encerrar  a multiplicidade de Institutos de Previdência, uns mais eficazes e fortes, outros nem tanto. O IAPETC era fortíssimo.

Pois o Penicilina tentou a eleição várias vezes, conquistando votações pífias, sucessivamente. Mas por uma eleição, acabou eleito com mais de mil votos – os conhecidos “votos de protesto”. Surpresa até pra ele. E então exerceu o mandato entre 1970 e 1972.

Dispenso falar dele. Prefiro ficar com a magistral escrita do nobre médico oftalmologista e meu digno amigo, Doutor Henrique Packter, reproduzida aqui e extraída da sua coluna neste portal, veiculada em 6 de abril de 2021. Notável e minucioso registro histórico, que pode ser acessado clicando aqui.

E finalizo aqui, porque o dia segue e eu preciso estar pronto pra ele.

Por Aderbal Machado 12/08/2023 - 10:07 Atualizado em 12/08/2023 - 10:09

Dia dos Pais. Para todos, filhos diletos ou não, fica a mensagem de valorar a cada dia mais seus genitores. Assim é. Assim fique à eternidade no exemplo de meu pai Telésforo.

Pois neste 13 de agosto, relembro Telésforo. Austero, forte, estigma de seriedade, monumento  de alforria pessoal, dileto amigo de tantos e muitos, intelectual convicto de muitos linguajares – poliglota de escol: alemão, francês, espanhol, italiano. Lia à constância quase diária “A Retirada da Laguna”, do Visconde de Taunay, em francês. Lia toneladas de alfarrábios jurídicos, traduzidos ao português por sua pena fina e aguçada. 

Escrevinhando suas petições prenhes de citações latinas e entremeadas de terminologias pouco entendidas (ao ponto de, numa delas - me contaram lá atrás, guri eu ainda -, o digno magistrado de plantão chamá-lo e indagar-lhe qual significado e objetivo daqueles sinônimos, antônimos, verbos e referenciais linguísticos do juridiquês, do latino e do português) por muitos naqueles tempos simplórios e muito saudosos.

No Dia dos Pais minha memória recua à década de 50, quando tinha eu um entendimento parco da vida, nascido em 1944. Telésforo se foi em 24 de outubro de 1959. Até ali, contudo, me encheu de visões fantásticas de saber. Autoditada, advogado provisionado (inscrição número 8 da OAB SC), nos induzia à leitura simples, sem interferências. Matriculou-nos na escola, sem controlar nada. Deixava correr. Quando perguntado, mandava consultar livros, estivesse ele ou não no conhecimento do fato.

Por isso crescemos todos ávidos por literatura, saboreando autores diversos e especificamente cada qual seguindo um rumo: César, Aryovaldo, Agilmar, Icleia, Aimberê e eu. Nesta ordem cronológica e não necessariamente rigorosa em se tratando de direções tomadas. À parte o fato de quatro seguirem o jornalismo como atividade principal: César, Aryovaldo, Agilmar e eu. Aimberê enredou-se pela atividade bancária (Banco do Brasil, 25 anos de trabalho) e acabou sendo o único a concluir curso superior (Direito), depois de “passado na idade”. Tinha avidez por estudos de sociologia, história e política. Aryovaldo e César tinham estilos ferinos e diferentes: um mais poético, outro mais conciso.

Ambos espetaculares. Agilmar mais popularesco. Também lanceiro do bem e da vida. Icleia decidiu-se por casar aos 18 anos, mas conquistou o magistério de corte e costura, professora da Escola Profissional Feminina Kirana Lacerda, do Araranguá até o aposento. Uma mestre das agulhas, dos panos e da moda.

Ah, Telésforo fez isso tudo acontecer. Sim. Não sem a assessoria vital de Dona Amarfilina. Ela quem forjava a personalidade espiritual de todos. Ambos nos fizeram livres para sermos  quem e como quiséssemos. Por isso tantas discrepâncias de visão de vida em todos, sem perder os liames entre um e outro, no entanto. Éramos e somos díspares e unos a um só tempo. Por isso, creio ver, claro e limpo, Telésforo se regozijando ainda agora, sobraçando uma estrela cadente lá em riba. E dizendo, remontando aos nossos erros: “Eu avisei”. E sorrindo, esgarçando nossos acertos e conquistas: “Eu ensinei”. E é tudo real e indefectível.

Olha, Telésforo, te digo (ou digo-te, vais me corrigir, sabiamente), guarda aí um lugar ao teu lado. Ajeita a mão pra colocar de novo no meu ombro. 

O recado tá dado, Telésforo. E me guie até lá, neste mundo de céus e infernos, dando-me força e sapiência para contornar tudo e seguir em frente.

Por Aderbal Machado 05/08/2023 - 09:43 Atualizado em 05/08/2023 - 10:06

Pois hoje, de  novo, é sábado.
E a cada dia passado, fica a dúvida: até quando? A velha liça entre o futuro e o passado. É mais ou é menos? Mais um dia ou menos um dia? O dilema existencial dá uma friagem. Em todo caso, vamos dar preferência hegemônica ao hoje. A vida é agora, afinal das contas. Ao menos quero e preciso acreditar muito nisso. Precisamos, na verdade.
A cada semana, a cada  mês, a cada dia, a cada hora, a cada minuto, a cada ano, vamos costurando essas dúvidas e colocando  no cérebro e no lombo o peso do tic-tac da existência. 

Mas bem, depois dessa filosofada barata, insípida e inodora, sigamos. Adelante e arriba!

Pensava aqui nas relações muito doidas, nalgumas vezes platônicas - pelo espaço geográfico a nos separar por tanto tempo (tempo demais) – com os manos falecidos. 

O César tinha comigo uma amizade e uma fraternidade multiplicada: irmãos de sangue, ele um quase pai (por ser o mais velho e eu o mais novo ou o “raspa do tacho”, como dizia ele, ou o caçula), um conselheiro emérito, um professor, um exemplo. Visitas ao César eram sempre modelos de gentilezas: ele me esperava à porta do elevador do seu prédio, lá embaixo e me conduzia até o apartamento, inobstante conhecesse eu o caminho. À saída, encerrada a visita por vezes longa e por vezes fortuita, ele abria a porta do apartamento, ia até a porta do elevador, dava um abraço e dizia a emocionante frase: “Menino, até a próxima”. Isso depois de uma derradeira conversa.

O Aryovaldo, em 1961, me levou para Criciúma, na flor dos meus 17 anos. Queria iniciar-me nas controvérsias políticas, em jornalismo e em rádio. Tinha uma certa fixação de seguimento da dinastia da família – quatro jornalistas depois,  mas até ali três: ele, César e Agilmar.
Lá, ele me deixou sonhar com residir em sua casa, cuja família estava bem constituída. Ledo engano. Me colocou numa pensão e mandou me virar para pagar a sobrevivência. Fiquei meio puteado com aquilo. Depois – bem depois – percebi sua intenção: fazer-me merecedor pela luta da vida, aguçando os sentidos dessa luta no dia a dia. Lição válida até hoje. Aryovaldo tinha ares diplomáticos. Porém, exsudava sentimentos diferentes do César: antipatizava rapidamente com alguém, com o mesmo ímpeto com que simpatizava. Rompia relações com igual força com que as formava. 

O Aimberê, cuja convivência mais próxima tive o privilégio de usufruir, tinha a noção do cuidador. Tinha-me, durante algum tempo, como o maninho mais novo a ser cuidado e protegido. Dávamo-nos muito bem. Com diferenças abissais de ideologia e visão de vida. Em todos os momentos vividos, à distância ou na intimidade das fofocas pessoais, jamais nos engalfinhamos. Isso foi realidade também com o César e o Aryovaldo. Com o Aryovaldo até houve momentos de mais tensão. Afinal arrefecidos pela natureza do sangue herdado de Telésforo e Amarfilina. 

Faço essas elucubrações por méritos e saudades. Dói bastante sentir o “nunca mais” em relação a eles. Nunca mais é tempo em demasia. 

Neste momento, deixo uma funda homenagem aos ainda vigentes, Icleia e Agilmar. Devo-lhes, igualmente, o respeito do tempo. 

O caçula “raspa do tacho” falou e disse.

Por Aderbal Machado 29/07/2023 - 11:05 Atualizado em 29/07/2023 - 11:06

Nos tempos de goleiro sem eira e nem beira do Grêmio Araranguaense (segundo time), convivi com Nilson (Nilson Matos Pereira) e Nedo (Enedir Perraro), goleiros titulares da equipe. Os treinos no estádio, cujas condições hoje desconheço, embora saiba estar ainda lá a propriedade, tanto tempo se passa desde a última vez – e lá se vão alguns muitos (e põe muitos nisso) anos de ausência.

Na equipe se misturavam jovens e experientes, como Jóia, Mememo, Serrano, Branca, Quirininho, Tito, Presalino, Valter, Tibica. Tinha o Adão, também (Adãozinho, originalmente goleiro do flamenguinho do Valmarino e depois do Grêmio, mas depois quis atuar na frente, com sua condição de rápido e bom driblador; baixinho, tinha pendores bons). 

A festa, entanto, se fazia no vestiário, antes e depois dos treinos,  nas tardes amenas do Araranguá de então – lá pelos idos finais da década de 50. Eu me deliciava com as gritarias do Nilson tomando banho gelado (dizia: “gritar desvia o choque”) e o Adãozinho, sempre cantando a sua música predileta: “Que importa saber quem sou, nem de onde venho e nem pr’onde vou...” (Trio Los Panchos, na música El vagabundo, um bolerão de arrepiar o cangote). Aquilo soava muito poético, muito etéreo. Enquanto ouvia, olhava o Morro Centenário, sobranceiro sobre a cidade, local da cruz comemorativa dos 100 anos do Araranguá. Lá de cima, onde poucas vezes fui, o visual era fantástico: descortinava-se toda a cidade e as névoas das distâncias da planície poética e do outro lado o litoral belíssimo, com visão do Arroio do Silva, praia da maioria das famílias – no tempo ainda bucólico dos casarios de madeira, sem cercados, postadas sobre as dunas e cercadas de gramíneas típicas do local.

Ali só se chegava a pé. Poucas tinham garagens. Edifícios muito poucos. Depois surgiram. Se bem me lembro, o Scaini, o hotel Paulista e o edifício Sobre as Ondas, onde antes tinha um casarão de madeira (hotel da família do Nego Boni, grande amigo do Aimberê e da cidade inteira). 

Penso, às vezes: precisaria ter ficado lá, gastando meu tempo com as belezas dos lugares. Melhor: investindo meu tempo. Entretanto, a maldição evolutiva é fatal.

Acabei obrigado a migrar para outras paragens e distante estou, manietado por obrigações e compromissos profissionais e por embaraços naturais da vida, após constituir família e fixar o pé no Litoral Norte. É bom estar aqui. Me sinto ótimo, não posso negar. Incomoda um pouco (isso em qualquer lugar) o materialismo, o consumismo, o torniquete da necessidade diária de sobreviver a qualquer custo. Isso me angustia um pouco, sem tirar o ânimo da luta – que prossegue.

Quem me dera poder ser o personagem da música cantada pelo Adãozinho. Vou ligar o som pra ouvir, pois a tenho aqui, num DVD fantástico de relicários musicais. 

“Que importa saber quem sou, nem de onde venho, nem pra onde vou”.

Por Aderbal Machado 22/07/2023 - 07:02

Tanto tempo longe do sul – do Araranguá e de Criciúma, principalmente -, mas ainda com a mente povoada de imagens das duas. Entretanto, filmes antigos.

Saudade de passear pela Avenida Getúlio Vargas, Rua Sete e Praça Hercílio Luz, no meu Araranguá e cruzar pelas Lojas Bandeirantes, Gomes&Garcia, Café Brasil, Lojas Grechi, Casa Cometa, Loja Triunfante, Armazém do Luiz Wendhausen, Posto Esso do André Wendhausen, Farmácia do Altícimo Tournier, Escritório do Dr. Arno Duarte, Hotel dos Viajantes, Hotel Labes, Loja de bicicletas do Elane Garcia, Usina da Força & Luz, Hotel Imperial, Telefônica, Escritório do Dr. Ramiro Ulyssea (altos do Café Brasil), Armazém do Crisanto Freitas, admirar a construção fantástica da casa do dr. Antônio de Barros Lemos, passar pelo bar e restaurante do Carlos Arcari, olhar o movimento dos finais de semana da Eve’son, admirar a branquitude do Fronteira Clube e jogar futebol na sua quadra de cimento, lá no fundo; comprar pão na padaria do Zé Guidi, correr pelos canteiros gramados do jardim Alcebíadas Seara e ser perseguido pelo fiscal Doca – que nunca nos pegava. Depois, comprar um gibi na banca do Willian e ler sentado na escadaria do coreto da praça ou dentro da Biblioteca Luiz Delfino. Tinha ainda, lá atrás (muito atrás), os papos alvoroçados com o Campolino, pedinte muito amigo de papai. E, de repente e quase sempre, encontrar o Loló perambulando.

Em Criciúma, saudade de passear pelo centrão. Aos domingos à noite, atopetado de gente de toda as tribos, sem qualquer preconceito, falando mal da vida alheia e contando mentiras e peripécias jamais acontecidas. E namorando muito nos bares da moda – e eram vários ao redor do jardim. Em dias comuns, circular por ali, passando pela Galeria Gigante, livraria do Osvaldo Souza, sapataria do Dalsasso, Farmácia Sampaio, Sapataria Lurdete, Casa Ouro, Casa Roque, Hotel Brasil, Casa Imperial, Cine Rovaris, Drogaria Rocha, Jugasa, Foto Zapellini, Café São Paulo, Café Rio, Casas Pernambucanas, Casas Jaraguá, Drogaria Catarinense, Musidisco, Lojas Fretta, Casa Londres, Carlitos Bar (o da gurizada central), Gruta Azul, Laboratório e Farmácia Sampaio, conversar com os taxistas na frente da prefeitura, levar um papo casual com o Bateria e o Burriquete. 

Deve haver uma infinidade de outras referências daqueles tempos. Não consigo recordar todas. É complicado. 

Fico aqui, coçando o bigode que não tenho e sentindo uma saudade que, esta sim, tenho e muita.

Por Aderbal Machado 15/07/2023 - 10:55 Atualizado em 15/07/2023 - 10:57

“Eram dez horas da noite, e eu estava reunido com dois homens num quarto do “Castelinho”, o chalé que o embaixador Batista Luzardo, um dos heróis da Revolução de 30, mandara construir em sua fazenda de São Pedro, estrategicamente situada no triângulo em que o Brasil faz fronteira com a Argentina e o Uruguai. Sentado a um canto, eu lia em voz alta o texto de uma entrevista com Getúlio Vargas que deveria ser publicada dois dias depois. Perto de  mim, também sentado, João Goulart mantinha estendida sobre uma pequena mesa sua perna esquerda, afetada há tempos por uma lesão que prejudicaria para sempre seus movimentos. O terceiro homem no quarto era o próprio Getúlio Dornelles Vargas. Ele acabara de eleger-se presidente da República.
As eleições haviam sido realizadas três dias antes, e Getúlio, lançado pelo PTB, obtivera uma vitória esmagadora. Terminada a apuração, ele alcançaria quase 48% dos votos, um resultado impressionante. Naquele 6 de outubro, Getúlio já tinha 800 mil votos a mais que a soma dos totais obtidos pelo brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN, e por Cristiano Machado, do PSD, seus dois adversários diretos. Aos 67 anos, o velho ex-ditador, que governou o país entre 1930 e 1945, estava de volta ao poder”.

A narrativa é a parte inicial, a abertura do livro “Minha razão de viver”, de Samuel Wainer, um dos ícones, ou lenda, do jornalismo político do velho Brasil, junto com Assis Chateaubriand.

Por aí se espelham coisas: o movimento político de então se baseava em forças políticas significativas e incontestáveis, no caso Getúlio e a força do jornalismo, em especial, o praticado no Rio de Janeiro e São Paulo. Tudo girava em torno disso, na hora das grandes decisões. 

Creio que os acadêmicos de jornalismo tenham lido o livro. Se não leram, leiam. Assim como leiam “Chatô, o rei do Brasil”, de Fernando Morais. 

Isto lhes dará uma dimensão das realidades a que chegamos. Negativa ou positivamente. Caberá a cada um imaginar ou concluir.

Sobre a obra, disse Augusto Nunes (que ainda está por aí):

“Num país em que quase todos os autores de livros de memórias parecem condenados a confirmar o “Poema em linha reta” de Fernando Pessoa, tentando congelar a imagem de quem foi só príncipe na vida, Samuel Wainer descreve grandes e pequenas derrotas, pecados maiores ou menores, com uma sinceridade desconcertante”.

Isso mostra que devemos ter o nosso próprio botão de autoexame acionado sempre.

Por Aderbal Machado 08/07/2023 - 10:25 Atualizado em 08/07/2023 - 10:42

Por preferência pessoal, as leituras minhas se resumem a obras de caráter político e/ou histórico, cujas abordagens focam personagens da nossa história ou da história mundial. Muito fascínio por Kennedy, Getúlio, Juscelino, Churchill, De Gaulle e tantos outros. Li e reli incontáveis vezes “Ascensão e Queda do Terceiro Reich” (Willian Schirer), “Minha Razão de Viver” (Samuel Wainer), “Chatô, o Rei do Brasil” (Fernando Morais), “Getúlio” (as três fases abordadas por Lira Neto), “O Capitão dos Andes” (R. Magalhães Júnior, uma narrativa romanceada baseada em fatos reais da Bolívia, na figura do ditador Dom Manuel Mariano Melgarejo, final do século 19). Há outras obras de minha leitura e postadas nas prateleiras de minha modestíssima biblioteca: “Histórias do Araranguá”. Uma do Padre João Leonir Dall’alba, esplêndido pesquisador que nem araranguaense era. Outra do Cônego Paulo Hobold, muito semelhante em dados, porém diferente nas abordagens. Ambas, bom dizer, ressaltaram a figura de meu pai, o Doutor Machado, ilustre partícipe da história verdadeira da cidade do Araranguá, a vetusta “Campinas do Sul”, lugar de muitos heróis dos tempos coloniais e republicanos.

Penso, às vezes, em espichar minha literatura. No entanto, sou meio chato (um eufemismo: sou chato mesmo, ao extremo) pra ser atraído por leituras de obras. Precisam me atrair nas primeiras linhas ou simplesmente não as leio. Fecho e guardo. Vejam bem: GUARDO. Não empresto e nem dou. Ficam lá. Quem sabe de repente sinta vontade de ler.

Isso pode limitar a carência ou a ausência de alguns conhecimentos, é bem verdade. Todavia, me livra de saturações também. 

São apenas hábitos. A idade pode ter influenciado, eis que, lá atrás, fui um voraz consumidor da chamada “fase das obras da juventude, chamados, muito apropriadamente “tesouros da juventude”: “A Ilha do Tesouro”, “Huckleberry Finn”, “Os Três Mosqueteiros”, “As Aventuras de Tom Sawyer”, “O Inferno de Java” (sobre o Cracatoa), “Robinson Crusoé”. Ah, sim e os quadrinhos. Houve época de consumo inusitado de toda a série Disney. Toda. Inteirinha. De Mickey e Pateta ao genioso professor Pardal e a João Bafodeonça, o malfeitor. 

E por isso, agora no crepúsculo da vida, quase dobrando o Cabo da Boa Esperança para descobrir meu ápice vital, prefiro ser seletivo, inobstante a saudade de minhas leituras d’antanho. 

Repito um dos meus versos prediletos de significado da vida: “Oh, que saudades que tenho, da aurora da minha vida, da minha infância querida, que os anos não trazem mais...” (Casimiro de Abreu). 

Pronto. Fechamos o esquema. Arrivederci.

Por Aderbal Machado 01/07/2023 - 10:12 Atualizado em 01/07/2023 - 10:15

Manhã de 1 de julho. No ano da Graça do Senhor de 1961, completavam nove dias de minha chegada a Criciúma para uma jornada de 21 anos ininterruptos de cidadania presencial. Lá aportei em 22 de junho, levado pelo mano Aryovaldo e assumi cargo na prefeitura, como auxiliar de almoxarife. Tinha 17 anos, mas idade naqueles bons tempos não era impeditivo. Era o governo recém-iniciado de Nery Rosa e Aryovaldo atuava na chefia do gabinete dele.

A missão funcional alterou um pouco meus hábitos de ociosidade no Araranguá: levantar muito cedo e chegar no serviço às sete horas, quando, no puxadinho de madeira atrás da antiga prefeitura, depois Fucri e Casa da Cultura. Ali ficavam várias salas de departamentos. A última abrigava o Almoxarifado. Salinha pequena, atulhada de badulaques e uma mesa rústica à guisa de escrivaninha. Nem máquina de escrever havia. Tudo no punho, na caneta. Naquela época a prefeitura tinha, se tanto, dois ou três caminhões, uma patrola  e poucos outros veículos. Uma Rural Willys, de uso do Aryovaldo, servia à fiscalização também.

Romantizo agora aquela época. Tinha certa dureza na atividade, a começar pela inexperiência e pelo inusitado da função. Todavia, a adaptação foi rápida. Dali se despachavam os trabalhadores da limpeza e das obras, maioria de recuperação de estradas, poucas delas pavimentadas – ao menos nas periferidas. A maioria dos lastros das estradas – e até de muitas ruas urbanas –  tinha como base a pirita, rejeito do carvão cujos efeitos danosos pouco se discutia, tanto no ar como no solo.

Pra garantir a vida, me hospedei no dormitório da Nini Schmitz e fazia refeições na Pensão da Vica. Os dois locais ficavam perto. O dormitório num prediozinho amarelo na esquina, perto da Jugasa. A Pensão da Vica ficava onde, depois, se construiu o pequeno edifício onde residiu o Dr. Raymundo Jorge Pérez. E quando relembro aqueles tempos, bailam na minha cabeça vetusta o cheirinho típico da fumaceira das chaminés das casas e bares produzindo o café da manhã, o fuzuê dos trabalhadores indo pras minas de bicicleta ou encarapitados em carroçarias de caminhões e os bares fervilhando de gente desde os primeiros minutos do dia.
 
O cheirinho de pastel quentinho dominava parte daquela hora, porque passava eu na frente dos botecos dali. Todos serviam pastel. Com uma novidade: pastel de carne, com carne. Parece redundância. Não é. Havia os famosos “pastéis de vento”: muita massa, necas de carne. Pois agora mesmo, neste sábado de 2023, julho, 1, isso me  vem a cabeça e olho pela janela, cá em Balneário Camboriú, cidade vicejada pelo frêmito da construção civil, pequena gigante da economia catarinense e brasileira, linda e aconchegante apesar do sufoco da vida cotidiana e, hoje, de suas tranqueiras urbanas agonizantes por vezes e benfazejas por outras, fico imaginando como teria sido se não fosse (ih, coisa da minha infância, trocadilho infame...). Poderia estar no Araranguá, sabe-se lá em qual realidade. Ou em Criciúma, quem sabe passeando de pantufa nalgum terreninho urbano ou vislumbrando as suas imensidões inimaginadas outrora, lá no frescor do 1961, julho, 1.

Eu vou, mas minha lembrança fica. Até. A paz do Senhor pros meus conterrâneos de fato, os araranguaenses, e os de adoção, os criciumenses.

Por Aderbal Machado 24/06/2023 - 09:09 Atualizado em 24/06/2023 - 09:10

Outra semana findando, já inverno, tempo bom e balançando na inconstância, sol e chuva (“casamento de viúva”), chuva e sol (“casamento de caracol”). Dependendo da região, claro. Aqui na borda norte do estado, o vento sopra de leve a favor. Solzinho simpático pairando sobre as paisagens, enfiando-se por entre a selva de pedras e beijando os cumes e as planícies. Dá vontade de poetar, inspirando-se nos versejares de Fernando Pessoa, JG de Araújo Jorge, Drummond.
Drummond disse, na sua mais famosa obra:

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

JG de Araújo Jorge arrasou assim:

Ouve estes versos que te dou, eu
os fiz hoje que sinto o coração contente
enquanto teu amor for meu somente,
eu farei versos...e serei feliz...

E hei de fazê-los pela vida afora,
versos de sonho e de amor, e hei depois
relembrar o passado de nós dois...
esse passado que começa agora...

Estes versos repletos de ternura são
versos meus, mas que são teus, também...
Sozinha, hás de escutá-los sem ninguém que
possa perturbar vossa ventura...

Quando o tempo branquear os teus cabelos
hás de um dia mais tarde, revivê-los nas
lembranças que a vida não desfez...

E ao lê-los...com saudade em tua dor...
hás de rever, chorando, o nosso amor,
hás de lembrar, também, de quem os fez...

Se nesse tempo eu já tiver partido e
outros versos quiseres, teu pedido deixa
ao lado da cruz para onde eu vou...

Quando lá novamente, então tu fores,
pode colher do chão todas as flores, pois
são os versos de amor que ainda te dou.

(Do livro "Meu Céu Interior" – 1934)

Fernando Pessoa, no poema de onde se extraiu a sua mensagem mais famosa:

Mar Português
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar! Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Sabe aquele sábado de inspiração quase zero e pouca vontade de elaborar textos? É hoje. Mas acho, e tenho convicção de terem vocês também achado isso: valeu a pena não ler minhas chatices corriqueiras e ler sobre gente tão exímia da literatura poética mundial e brasileira.

Apelo à vossa bondade para compreender-me.

Por Aderbal Machado 17/06/2023 - 11:33 Atualizado em 17/06/2023 - 11:34

Meu avô é nome de rua em Palhoça, onde foi veredor e primeiro prefeito, tendo sido, ainda, deputado estadual. Meu pai é nome de rua em Araranguá e Criciúma. Ambos foram personagens históricos vitais nessas cidades, por seu trabalho e vivência, na atividade profissional e política. Papai foi primeiro advogado e primeiro professor no Araranguá, por exemplo, no começo do século 20 e foi, ainda no Araranguá, incisivo líder político do Partido Liberal. Em Criciúma, exerceu advocacia ali e nas comarcas vizinhas. 

Pesquisa incompleta dos ramos familiares: 

A árvore genealógica da família até onde sei e consegui pesquisar: 

Meu pai

Manoel Telésforo Machado
NASCIMENTO 5 JAN 1878 • Palhoça (SC)
FALECIMENTO 24 OUT 1959 • Araranguá (SC)

Minha mãe
Amarfilina Martins Machado
(Nascida em 15 de abril de 1905)
Morte - 01 de novembro de 1980 • Araranguá 
Meu avô
Bernardino Manoel Machado (Nascido em 1850) – Falecido em 31 de março de 1918 • em Araranguá. Dia e mês de nascimento não sei. 

Minha avó
Constança Maria da Conceição (Nascida em 1843) – Falecida em 2 de dezembro de 1880 • Em Florianópolis. Dia e mês de nascimento não sei. 

Os irmãos (filhos de Amarfilina e de Telésforo) 
Adherbal Telésforo Machado Nascido em 4 de janeiro de 1927. Falecido em 16 de agosto de 1943 • Em Araranguá.

Attahualpa César Machado – Nascido em 20 de junho de 1929 • Araranguá. Faleceu em 2009 em Florianópolis.
Aryovaldo Huáscar Machado – Nascido em 17 de agosto de 1931 • Araranguá (SC). Faleceu em 22 de novembro de 2012, em Florianópolis.
Agilmar Machado – Nascido em 28 de julho de 1934 • Araranguá
Icléia Machado Souza – Nascida em 8 set 1936 • Araranguá
Aimberê Araken Machado – Nascido em 28 set 1939 • Araranguá – Faleceu em 03 de dezembro de 2022, em Florianópolis. 
Aderbal Machado (eu) – Nascido em 10 de maio de 1944 • Araranguá, na velha e inesquecível Boa Vistinha. 
Irmãs por parte de pai (de um primeiro casamento de Telésforo) 

Constança Flor de Liz Machado Pacheco – Nascida em 1898 – Falecida em 1982
Licínia Adalbertina Machado da Silva – Não tenho outros dados 
A falta de dados de alguns antepassados resulta da pesquisa: ela é feita baseada na família Machado. É o caso dos parentes de minha mãe, donde só tenho o nome da avó. Por extensão familiar, somos ligados a famílias Silva e Pacheco, do Araranguá, decorrente da união das filhas do primeiro casamento de papai, Licínia e Constança.

Um detalhe histórico vital: 

Meu avô e sua forte carreira política e social em Palhoça e São José 

Bernardino Manoel Machado, primeiro prefeito (Superintendente), de Palhoça, foi comerciante de secos e molhados e, como militar, integrante da Guarda Nacional. Ocupou o posto de capitão por Carta Patente assinada por Deodoro da Fonseca em 18 de fevereiro de 1891. 

Chegou ao posto de Tenente-Coronel, no quartel mestre da Guarda Nacional da Comarca de São José. 

Sem auferir lucros, Bernardino manteve paralelo ao seu comércio uma modesta botica, oferecendo à população local e limítrofe seus conhecidos préstimos de manipulador homeopático. Era muito conhecido por suas garrafadas, popular beberagem doméstica preparada e vendida como remédio, cuja composição, invariavelmente, é à base de ervas e raízes.  

Na política, conquistou importantes funções públicas, principalmente as de Vice-Intendente do Município de São José e primeiro Superintendente Municipal de Palhoça, cuja emancipação, desligando-se de São José, contou com sua firme liderança, prestigiado que foi pelo bom número de políticos locais. Foi, ainda, deputado no Congresso Representativo do Estado, em 1894, pelo Partido Republicano Catarinense. 

Bernardino Manoel Machado faleceu aos 68 anos, no dia 31 de março de 1918, em Araranguá, para onde se mudara em 1904. 

(Autoria de César do Canto Machado, bisneto de Bernardino e pesquisador. Artigo retirado dos anais históricos da Assembleia Legislativa de SC)

Em Criciúma, no belo Bairo Ana Maria, há uma rua muito bem cuidada com o nome de meu pai.
No Araranguá, uma rua com o nome de meu pai fica no Bairro Cidade Alta.
Em Palhoça, uma rua com o nome de meu avô fica na Ponta de Baixo.

Por Aderbal Machado 10/06/2023 - 10:46 Atualizado em 10/06/2023 - 11:04

Depois de toda a idade suportada ano após anos, nossa mente vai evoluindo num sentido e involuindo noutro. Tipo assim (como dizem os mais jovens): acumula-se conhecimento e se locupleta de lembranças irreversíveis (explico, memórias de eventos vividos e não mais passíveis de repetição). A involução é o sofrimento danado de ver as imagens esmaecidas de nossas peripécias da juventude, ainda no vigor físico, sem possibilidade de revivê-las. Isso é atroz. Coisas até simples: dançar muito, pular carnaval, correr, jogar futebol, andar rápido, subir escadas de dois em dois degraus (oh, saudade...). 

A diferença boa da idade provecta é podermos mandar tudo às favas sem culpa, pois nada mais nos freia, exceto essa merda da iniquidade do corpo pelado, dos dentes frouxos, dos cabelos pouquíssimos (e muito brancos) e das perspectivas derradeiras de chegar até ali, não mais até lá, por absoluta fragilidade física.

Pensei até numa reciclagem. Restou-me, no entanto, apenas a visão de congelamento, pra reativar-me séculos depois. A ciência está atrasada. 

Serei mais objetivo e simples: saudade das confusões dentro das redações, dos vídeos travados obrigando-nos a improvisar no ar e ao vivo, nos entrevistados faltosos à última hora e os sem aviso (e nem desculpas pediam). 

Mais objetivo e simples ainda: saudades do futebolzinho, das incursões pela região sul com o time de futebol de salão da emissora (ou o time de futebol de campo com sete jogadores). E assim éramos convidados para jogos e festanças inesquecíveis em Urussanga, Siderópolis, Araranguá, Praia Grande, Sombrio, Orleans, só para citar algumas cidades. O pessoal de televisão, principalmente, era cortejado como artistas famosos. Sentíamos imenso prazer nisso, é claro. Ainda mais sentindo o retorno de um trabalho artesanal, um jornalismo fecundo, voltado aos interesses específicos da região sul. 

O futebol era somente o retrato dessa união conjuntural. A assinatura indelével do carinho recíproco nutrido entre os fãs e os (me permitam o abuso) “artistas”.

Por Aderbal Machado 03/06/2023 - 08:59 Atualizado em 03/06/2023 - 10:00

Agora mesmo, 2 de junho, fechei o primeiro ciclo anual de serviços na Rádio Câmara de Balneário Camboriú (@camarabc, na Internet). Um ano fugaz, rápido como o vento. Parece ter sido ontem. Fora do rádio por muitos anos, fiquei surpreso com o convite. De repente, um telefonema no meio da tarde me oferecendo a vaga. Era a chefe do RH da empresa Rockset, gestora da programação por contrato licitado pela Câmara. A surpresa teve várias razões: primeiro por ser eu e segundo por existirem tantos outros profissionais na área mais jovens. E eis a questão: a idade ficou fora da pauta desde o primeiro instante. O único questionamento não feito pela empresa. 

Confesso ter ficado em dúvida. Afinal, a tecnologia atual na atividade é utilizada enormemente e eu só sei (ou sabia) o feijão e arroz. Bem, contratado, cheguei lá e espantei com a montoeira de computadores e botões para manipular na apresentação do programa: a emissora é oficial, lincada com a Rádio Câmara de Brasília e responsável, também, por compartilhar as programações do Congresso Nacional quando exigido formalmente. As manobras pra lá e pra cá são muitas, na entrada e saída das programações. Estava longe disso e algumas dificuldades de adaptação se apresentaram. Mas o aprendizado foi até rápido. Aperta daqui, erra dali, tira do ar aqui, põe ali e cheguei a um ponto ideal. Sei manipular aquela “barriga de porca” cheia de tetas. Estou afiado.

A grande diferença: na Rádio Câmara, oficial, há distância necessária de análises e abordagens polêmicas. Ainda mais de política, por razões óbvias. A convivência com os vereadores de todas as correntes ideológicas e de pensamento, cada um com sua forma e o jeito de querer e ser, faz a gente se equilibrar entre suas preferências. As entrevistas são pautadas por eles. Porém, chegou num ponto de eu indagar a cada um, e pedir autorização, pra adentrar um bocadinho em questões políticas. Sem juízos de valor, porém com assertividade. Todos concordaram e estamos indo bem.

O principal disso é: o Deba velho de guerra, do seu berço esplêndido de inatividade e aposentadoria usufruída com modestos méritos, retornou, aos 78 anos, à falação convencional num microfone. 

A interatividade com colegas maravilhosos tem sido ótima. Gente mais nova – alguns bem novos – conduzem-me a um patamar diferente: o de aprender. A tal ponto ser a minha designação entre eles, carinhosamente (e para mim orgulhosamente) é “nosso estagiário”. Adoro. E assim vamos derrubando paradigmas. Vivamos nós. E vamos pra frente. Temos mais vida lá adiante.

Por Aderbal Machado 27/05/2023 - 11:10 Atualizado em 27/05/2023 - 11:11

De repente, só de repente, sobrevêm lembranças de quando, enfiado no rádio em tempo integral – “full time”, dizia o Coronel Euclides Simões de Almeida, diretor da Rádio Diário da Manhã, onde estive por um ano em 1976 – convivi com figuras especiais, com seus hábitos, trejeitos e manias. Cada um tinha a sua. A do Antônio Rosa era cuidar bem do penteado antes de ir ao ar na TV Eldorado. A do Clésio Búrigo era caprichar nos muitos dados das suas matérias esportivas, verdadeira aula de conhecimento. O Milioli Neto pouco ligava pra nada. Chegava de inopino, ouvia as matérias ou nem isso e entrava no ar queimando o chão, como se dizia, com uma acidez crítica conhecida ao longo dos tempos. A Adilamar Rocha tinha o ar de magnânima senhora da simpatia, cuidando palavra por palavra. No outro lado do jornalismo da época, o André Martins, com sua indefectível “André Martins e a Saudade”, estilo romântico de programa com músicas saudosistas d’antanho e poesias – ao permitir-se arroubos mais ousados, mandar recados pra suas fãs. 

Fora do microfone, em outros muitos momentos, nossa convivência prosseguia próxima e, no entanto e contraditoriamente, distante. Por quê? Nossos hábitos privados e pessoais fora da emissora eram díspares. Até os ambientes frequentados nem sempre eram os mesmos. E os gostos e prazeres também não coincidiam. Amigos, sim. Colegas de ofício, sim. Mas cada um na sua. Ou, como hoje se diz, “cada um no seu quadrado”.

Essas elucubrações surgem assim. Num relâmpago. Vejam ser nada sério.

Finalmente, algumas pessoas de fora do meio tinham intimidade conosco e nossa vida, até. Como o tradicional e famoso garçom, o Edgar, cujos serviços eram prestados em nossos almoços de final de ano e os festivos do Dia do Radialista, sempre promovidos pelo Evaldo Stopassoli aos funcionários. Não falhou um ano. Do Edgar tenho doces lembranças, como quando recebi no estúdio Francisco Petrônio e fui obrigado a levá-lo ao Restaurante Castelinho, trabalho do Edgar e ao lado da rádio, para apresentá-los pessoalmente, tal fã com frenesi do cantor ele era. A alegria do Edgar superou qualquer expectativa e me dá ânimos até hoje.

Por Aderbal Machado 20/05/2023 - 09:47 Atualizado em 20/05/2023 - 09:50

Olhei pela janela e vi um sábado com céu azulado e recoberto de esparsas nuvens. Dia de descanso. Em tese. Estou, afinal, aqui, unindo sílabas e tentando dar um sentido no começo do dia ante o compromisso de preencher o blog com ideias razoavelmente aceitáveis, coisa nem sempre atingida. Enfim, é o padrão dos desavisados, como eu: nem tudo dá o resultado esperado ou desejado. E este é o risco do nosso caminhar pelas sendas da vida, pessoal e profissionalmente.

Ando sonhando coisas muito malucas: às vezes perdido na cidade, sem saber onde moro e onde trabalho; estaciono o carro e esqueço onde – e jamais encontro; circulo pelos locais e nem sei onde estou. Já me disseram pra tomar cuidado com o “alemão”. Pode ser. Estou brigando e correndo dele há tempo. Ocupando a cachola com coisas e mais coisas.

Pois, meus jovens mancebos: neste dia, de novo, tercei armas na gana de encontrar um pedaço de inspiração. Um pedaço só. Uma nesga. Uma réstia de luz. Nessas condições, recorro às lembranças do passado – nem tão fértil assim. Às experiências saboreadas – ruins e boas.

Noutro dia falei dos meus momentos do rádio e da televisão em Criciúma, começo de tudo. Falo de novo.
Ainda me cobre os olhos a visão da área circular do prédio da TV Eldorado, com seu jardim, onde nós, os colaboradores, nos reuníamos para fofocar. Falar da vida dos outros, pois os outros falam da nossa. Ali surgiam teses incríveis e absurdas sobre o comportamento humano e eram combinadas artes e sacanagens com colegas. Aquele prédio abrigou tanto disso, principalmente quando, em algumas épocas, morcegos se abrigavam nas claraboias e os capturávamos para assustar os desavisados.

Ali, também, surgiram profissionais de altíssima capacidade. Principalmente porque, naquelas condições técnicas e tecnológicas, éramos meio heróis, lidando com deficiências naturais e sobrepondo às carências o esforço e a criatividade. Tempos sem os recursos atuais: celulares, internet, computadores, CDs, DVDs e outros bichos menos votados. E então aperfeiçoamos nossas capacidades ao infinito. Graças a Deus foi assim.

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